Juntas elas se tornam mais fortes e chegam mais longe
Temas transversais como associativismo, informação, arte e preconceito atravessam e norteiam o caminho percorrido por elas em busca de um lugar ao sol no masculinizado universo agro
por Rosimeri Ronquetti
em 05/10/2023 às 6h08
5 min de leitura
*Matéria originalmente publicada em 13 de março de 2023
O verso “uma andorinha voando sozinha não faz verão”, da conhecida música “Andorinhas”, do Trio Parada Dura, faz todo sentido para centenas de mulheres que se juntaram para conquistar seus sonhos ou, tão somente, ajudar a manter as famílias no campo.
Formada há 22 anos, a Associação de Agricultores Familiares Agroecológicos Orgânicos de Campinho de Iconha, mais conhecido como “Vero Sapore”, em Iconha, é um exemplo disso. Donas de pequenas propriedades e em busca de alternativas de renda, Celesia Bonadman Marion, Erotildes Cremonini Ronqueti, Valkiria Bonadman Marion e Erenilda Luzia Chuina Ferreira Guio decidiram aproveitar melhor os produtos da roça.
Antes da formação do grupo, elas produziam por conta própria, cada uma em sua casa. Até que se juntaram, padronizaram os produtos e ganharam força. Tudo o que produzem, pães, bolos, biscoitos, banana passa, doce de banana sem açúcar, entre outros, é comercializado em feiras na Grande Vitória.
“O grupo foi de suma importância para mantemos nossas famílias na roça. Nossas propriedades são pequenas e não temos como viver da monocultura. Nos juntar foi a maneira de ganhar força. Sozinhas, seria impossível levar nossa produção para vender na Grande Vitória, por exemplo. Sem esse trabalho com certeza nossas famílias não estariam mais na roça”, explica Erenilda, uma das fundadoras do coletivo.
Para auxiliar na organização da associação, elas buscaram ajuda do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Espírito Santo (Sebrae-ES), fizeram curso de atendimento ao cliente e associativismo e participam de palestras e intercâmbios oferecidos pelo órgão. Outra conquista foi a aquisição de um espaço próprio e equipamentos para agroindústria.
A presidente da Findes, Cris Samorini, destaca que “o associativismo é uma ferramenta extremamente importante para qualquer pessoa, em especial para as mulheres. Cada pessoa contribui para fortalecer o seu setor e, quando elas se unem, podem alcançar objetivos comuns, pleiteando pautas prioritárias e indo mais longe”.
Além das questões comerciais e de visibilidade, outra importante função dos grupos de mulheres do agro é promover a confiança e a autoestima das participantes. Nailza Vilela (46), de Vila Valério, participa desde 2013 do Núcleo de Mulheres da Cooperativa de Produtores de São Gabriel da Palha (Cooabriel) e, ao longo dos anos, viu a vida mudar para melhor.
“Antes de fazer parte do Núcleo, eu era muito tímida, morria de vergonha de chegar nos ligares públicos, tinha autoestima muito baixa. Falar em público nem pensar! Eu achava não ser capaz de me relacionar com as pessoas. Através das palestras nos encontros fui ganhando confiança, minha autoestima foi mudando. Hoje, consigo falar com as pessoas olhando nos olhos delas, em público, isso mudou a minha vida”, diz Nailza.
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Em abril de 2017, o marido da produtora sofreu um acidente de trabalho, passou cinco meses internado e saiu do hospital em estado vegetativo. Um ano após o retorno dele para casa dos sogros, onde a família passou a morar, e com ele já na cadeira de rodas, ela decidiu ser a hora de voltar para casa e retomar as atividades do sítio.
Nessa época, surgiu a oportunidade de vender a propriedade, distante da casa dos pais, e comprar outra mais próxima. “Nunca tinha feito nada sem comunicar ao meu marido. Então decidi que ia vender, seria bom para todos. Vendi, comprei outra, me mudei e comecei uma nova vida”.
Hoje, quase quatro anos depois de assumir a gestão da propriedade, já dobrou a plantação de café, plantou pimenta, colocou energia e irrigação no terreno. Separada há quase um ano, Nailza comprou a parte do ex-marido no terreno e segue tocando ao lado do filho adolescente.
“O Núcleo me ajudou a ficar preparada para enfrentar tudo que passei e esteve presente o tempo todo. Mudou a minha vida. Hoje sou uma mulher muito mais forte e confiante”, afirma.
Além do Núcleo de Mulheres da Cooabriel, outras cooperativas também formaram coletivos. É o caso do Póde Mulheres, da Cooperativa dos Cafés do Sul do Estado (Cafesul); e das cooperativas dos Cafeicultores da Região de Lajinha e Iúna (Coocafé) e da Selita.
Já as associações estão presentes em vários municípios. “Sonhadoras Vitoriosas da Aap”, criada pelas mulheres do Assentamento Zumbi dos Palmares, em São Mateus; Associação “Mulheres do Campo”, de Santa Teresa; Associação das “Mulheres do Cacau”, formada por mulheres de Linhares, Rio Bananal e Colatina; projeto “Elas Podem nas Criações das Abelhas”, com mulheres de Aracruz, Sooretama e Linhares; e a “Associação de Agricultoras Familiares- Mulheres do Canaã”, de São Roque do Canaã.
CONTINUA…
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