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Economia

Impacto da Covid-19 sobre o setor cafeeiro global: o lado da demanda

Estudo da OIC se concentra nos efeitos da pandemia no lado da demanda, avaliando a relação entre um crescimento econômico reduzido e a redução do consumo global

por Redação Conexão Safra

em 18/04/2020 às 15h17

6 min de leitura

Impacto da Covid-19 sobre o setor cafeeiro global: o lado da demanda

*Fotos: Assessoria SIC/Divulgação

A pandemia do novo coronavírus (Covid-19) é uma crise dramática da saúde pública, com impacto significativo sobre as economias do mundo. A propagação da doença representa um choque econômico sem precedentes em um mundo interdependente, pois a demanda e a oferta ao redor do globo e entre setores diminuem.

O impacto da pandemia sobre o setor cafeeiro global provavelmente será profundo, abrangendo produção, consumo e comércio internacional. É o que aponta a Organização Internacional do Café (OIC) no primeiro número da série “Coffee Break ”, sua nova publicação econômica. O estudo se baseia em análises de questões de política cafeeira e estratégicas conduzidas pelas Seções de Economia e Estatística da OIC.

O impacto das medidas de distanciamento social, incluindo o lockdown (bloqueio) de grandes partes do setor de hospitalidade, é discutido. Mais análise é necessária, em particular do impacto sobre o lado da oferta, para entender os efeitos gerais para o setor cafeeiro e para todos os atores ao longo da cadeia global de valor. Esses efeitos serão avaliados em números futuros da série.

Análise

A análise se baseia em uma amostragem dos 20 maiores países consumidores de café, que representam 71% da demanda global, e cobre o período de 1990-2018. Os resultados mostram que um ponto percentual de queda no crescimento do PIB está associado a uma redução do crescimento da demanda global de café de 0,95 ponto percentual, ou 1,6 milhão de sacas de 60 kg.

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A propagação da Covid-19 apresenta um desafio adicional considerável ao setor cafeeiro global, que vem atravessado um longo período de preços baixos ao produtor. Apesar do crescimento geral do setor, os preços do café têm-se caracterizado por uma tendência continuamente baixista desde 2016, caindo para 30% abaixo da média dos dez últimos anos.

*Fonte: OIC

Muitos dos 25 milhões de cafeicultores no mundo todo, a maioria pequenos, lutam para cobrir seus custos operacionais, pois os preços dos insumos continuam a subir. Em consequência, as receitas agrícolas declinam e os meios de sustento dos cafeicultores correm riscos crescentes. A falta de investimentos na modernização das lavouras e na adaptação ao impacto das mudanças climáticas traz um grave risco à sustentabilidade do setor e ao futuro da oferta de café.

“Após a colheita, se os preços estiverem dentro de um patamar que cubram minimamente os custos, a recomendação é que os cafeicultores vendam na quantidade para, pelo menos, cobrir as despesas e dívidas de curto e médio prazos. Não devem ofertar de maneira desenfreada e nem estocar para especulações. Calma e prudência são as palavras do momento. Afinal, a nossa centenária cafeicultura já passou por tantas crises, e vai passar por essa também ”, avalia o agrônomo do Incaper e especialista em Administração e Socioeconomia Rural, Enio Bergoli.

Análise e principais resultados

No curto prazo, o consumo fora de casa vem diminuindo em escala significativa, pois mais e mais países vêm adotando uma política de bloqueio total ou parcial. Escritórios, cafés e restaurantes se mantêm fechados para reduzir a propagação do vírus.

Por outro lado, dados sobre o comércio no varejo e supermercados sugerem que as compras em pânico e o armazenamento doméstico de provisões levaram a um aumento da demanda em alguns países. É improvável que isso tenha um efeito duradouro no consumo, porém. Depois de um pico inicial, a demanda diminuirá proporcionalmente nas próximas semanas e meses, à medida que os consumidores forem usando os estoques mantidos em casa.

“Os consumidores dos países com maior consumo de café estão levando mais a sério a pandemia, em termos de isolamento e distanciamento social, até por uma questão educacional e cultural. Na Europa, por exemplo, grande consumidora de cafés, o hábito e a forma de consumo são diferentes do mercado brasileiro. Por lá, é muito significativo o consumo fora do lar. Porém, o consumo no lar sempre está acompanhado de desperdício. O café que esfria não é bebido, mas jogado fora ”, destaca Bergoli.

Enio Bergoli é engenheiro agrônomo do Incaper e
especialista em Administração e Socioeconomia Rural. (*Divulgação)

Pode-se esperar um efeito mais profundo na demanda global de café em consequência da recessão global desencadeada por efeitos diretos e indiretos da pandemia da Covid-19. A redução das rendas familiares poderá se traduzir em menor demanda por café, em termos de volume.

Além disso, consumidores sensíveis a preços poderão substituir café de valor mais alto por blends ou marcas de menor valor. A elasticidade de renda da demanda de café provavelmente será pequena, sobretudo em países de alta renda e mercados tradicionais com taxas elevadas de consumo per capita.

Discussão e próximas etapas

As variáveis dos resultados oscilam consideravelmente, refletindo recessões econômicas regionais e globais do passado global (por exemplo, crise finaneira asiática de 1998, grande recessão de 2008). Em princípio, essa variação ajuda a isolar os efeitos dos ruídos estatísticos e possibilita previsões robustas.

No entanto, o poder de previsão do modelo está sujeito a certas limitações. Elas têm a ver com o uso de dados históricos para projetar o impacto da epidemia da Covid-19, que em muitos sentidos é excepcional.

Primeiro, é improvável que qualquer das crises financeiras anteriores se compare, em termos da magnitude e severidade do choque (mas potencialmente também da recuperação), com o impacto da Covid-19 sobre a economia global.

Segundo, muitas das medidas tomadas pelos governos em reação à Covid-19 não têm precedentes. Por exemplo, as medidas de distanciamento social causaram uma paralisação de grandes partes dos setores varejista, de hospitalidade e turístico. Isso poderá afetar severamente o consumo fora de casa e, assim, a demanda geral de café, se o déficit não for compensado por maior consumo em casa.

Finalmente, além da redução da quantidade do café consumido que é analisada neste resumo, efeitos de substituição são prováveis. Consumidores sensíveis a preços poderão procurar alternativas mais baratas para o café que compravam antes da crise ? por exemplo, substituindo cafés de marcas de prestígio e cafés especiais por outros de preços mais baixos. Mais pesquisas serão necessárias para quantificar esses efeitos. (*Com informações da série “Coffe Break- OIC)

*Leia também artigo:
A pandemia da Covid-19 e o comportamento do consumo mundial do café

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