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Tecnologia

Crisopídeos promovem manejo sustentável e eficaz de pragas no café

Com características únicas, esses insetos em sua fase larval mostram-se vorazes predadores de diversas pragas agrícolas

por Leandro Fidelis

em 27/05/2024 às 5h00

9 min de leitura

Crisopídeos promovem manejo sustentável e eficaz de pragas no café

*Fotos: Acervo Epamig e Madelaine Venzon/Divulgação

O uso de crisopídeos na cafeicultura está se destacando como uma prática promissora no manejo sustentável de pragas. Com características únicas, esses insetos em sua fase larval mostram-se vorazes predadores de diversas pragas agrícolas.

A presença desses seres verdejantes com asas transparentes e rendadas é essencial para o equilíbrio dos ecossistemas agrícolas, onde contribuem para a redução da população de pragas, incluindo ácaros, pulgões, cochonilhas e bicho-mineiro, entre outros. Um produtor do Espírito Santo relata resultados promissores com o uso de crisopídeos na lavoura de café, destacando a eficácia dessa prática no controle de pragas e na redução do uso de defensivos químicos.

Segundo Madelaine Venzon, pesquisadora da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), os crisopídeos são semelhantes às borboletas, pois passam por várias fases de desenvolvimento: ovo, larva, pré-pupa, pupa e adulto. Enquanto os adultos se alimentam de néctar e pólen, as larvas são as principais responsáveis pelo controle de pragas, utilizando suas mandíbulas em forma de pinças para consumir o conteúdo interno das presas. Algumas espécies de larvas carregam restos das presas em seu dorso, ganhando o apelido de “bicho-lixeiro”.

Naturalmente presentes em várias regiões cafeeiras do Brasil, a densidade dos crisopídeos pode variar conforme as práticas agrícolas locais. O uso intensivo de agrotóxicos e a falta de diversificação do cultivo reduzem significativamente sua presença, afirma Madelaine. A necessidade de pólen e néctar para os adultos pode ser suprida por plantas associadas, como adubos verdes e arbustos, essenciais para a manutenção do ciclo de vida dos crisopídeos no ambiente.

Na cafeicultura, as larvas de crisopídeos são predadoras generalistas, alimentando-se de pragas como o ácaro vermelho, pulgões, cochonilhas, lagartas pequenas, bicho-mineiro e broca-do-café. Pesquisas recentes da Epamig revelaram a habilidade dessas larvas de penetrar nas galerias da broca-do-café, consumindo ovos, larvas e pupas dessa praga.

“Além disso, os crisopídeos sobrevivem se alimentando somente da broca-do-café. Com relação ao bicho-mineiro, verificou-se que as fases mais atacadas são os ovos e as pupas do bicho-mineiro. No entanto, dependendo do estágio das larvas de crisopídeos, essas também podem consumir larvas no interior das minas”, destaca a pesquisadora.

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Adulto de crisopídeo.

Cobertura verde

Para garantir a presença contínua dos crisopídeos nas plantações de café, a Epamig desenvolveu tecnologias que promovem a diversificação do plantio com plantas fornecedoras de pólen e néctar. Entre essas plantas estão o trigo mourisco, crotalarias, guandu anão e crambe, além de arbustos e árvores como ingá, fedegoso e erva baleeira, dispostos em corredores ecológicos, que proporcionam néctar floral e extrafloral.

De acordo com Madelaine Venzon, essas estratégias visam completar o ciclo de vida dos crisopídeos dentro dos plantios, evitando a necessidade de migração dos adultos para busca de alimento. “O pólen e o néctar também podem ser utilizados pelas larvas dos crisopídeos nos períodos em que não há pragas (presas). Desse modo, elas não se dispersam para fora dos plantios”.

Em regiões onde a incidência natural dos crisopídeos é baixa, pode-se recorrer à liberação de ovos adquiridos de fornecedores registrados no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Com a implementação das medidas mencionadas, a necessidade de liberações frequentes tende a diminuir, tornando o processo mais eficiente e econômico, garante a pesquisadora da Epamig.

“Com relação à diversificação, as técnicas estão avançando, mas é preciso ainda um trabalho de treinamento de técnicos e agrônomos que prestam assistência às fazendas produtoras de café, uma vez que o modelo deve ser adaptado a cada realidade. Mais informações sobre as liberações dos crisopídeos devem ser fornecidas pelas empresas aos produtores, bem como a necessidade ou não de liberações extras”, diz Madelaine.

Além do controle biológico no campo, os crisopídeos também podem ser utilizados em ambientes fechados, como casas de vegetação. Sua criação massal é facilitada pelo uso de dietas artificiais para os adultos, cujas fêmeas são altamente prolíficas. Atualmente, a espécie Chrysoperla externa é comercializada, mas outras espécies nativas, como a Ceraeochrysa cubana, também mostram potencial para o controle de pragas como cochonilhas.

*Fotos: Divulgação

Vantagens

O uso de crisopídeos apresenta várias vantagens: não contamina o meio ambiente, não há riscos toxicológicos, e não há períodos de carência para a colheita ou entrada nos plantios. Quando aliado às técnicas de diversificação desenvolvidas pela Epamig, reduz-se a necessidade de liberações frequentes, promovendo uma economia significativa. Além disso, a liberação por drones evita a compactação do solo causada por máquinas.

A Empresa de Pesquisa Agropecuária continua a pesquisar novas plantas fornecedoras de alimento e a avaliar outras espécies de crisopídeos em combinação com outros métodos de controle. Estudos sobre a densidade populacional necessária para as liberações e a possibilidade de liberação de larvas, que são menos suscetíveis à predação por formigas, estão em andamento para otimizar o uso dos crisopídeos.

Renan Queiroz, pesquisador do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), na foto acima, destaca que os crisopídeos são predadores naturais eficazes contra diversas pragas do café. No entanto, enfatiza a necessidade de práticas agrícolas integradas, pois o uso indiscriminado de inseticidas pode prejudicar esses predadores. A produção e a comercialização em larga escala dos crisopídeos são desafiadoras, exigindo infraestrutura adequada e transporte eficiente.

Queiroz acredita que o futuro do controle biológico, incluindo o uso de crisopídeos, é promissor, especialmente quando associado a métodos de controle seletivos e sustentáveis. “Vejo com bons olhos, pois é um método de controle eficiente que vai ajudar muito o produtor. Tem aumentado muito a demanda por produtos biológicos para associar aos métodos de controle na obtenção de alimentos mais saudáveis, sem resíduo de produto, não somente no café como em várias culturas”, ressalta.

Segundo o pesquisador, a principal vantagem da utilização de inimigos naturais no controle de pragas é o custo mais baixo e a redução do uso de pesticidas, resultando em menor resíduo químico. No entanto, é necessário realizar liberações constantes desses inimigos naturais, já que a população de pragas pode aumentar rapidamente, exigindo o uso inicial de produtos químicos para reduzir a infestação antes de manter o controle com métodos biológicos. A velocidade do ciclo de vida das pragas, muitas vezes mais rápida que a dos predadores, complica esse processo.

Renan Queiroz reforça ainda a importância de realizar mais testes de liberação de inimigos naturais e de avaliar a eficiência no campo. Além disso, sugere testar produtos químicos que não causem mortalidade ou efeitos subletais nesses inimigos, permitindo uma associação eficaz entre controle químico e biológico. “No Espírito Santo, não se encontram crisopídeos à venda. O inseto só é encontrado em sites especializados na internet”.

Crisopídeo na fase larval na folha de café.

Questão de tempo

O produtor e engenheiro agrônomo Ítalo Bada, da zona rural de Rio Bananal, Norte do Espírito Santo, relata sua experiência positiva com o uso de crisopídeos na redução de pragas na lavoura de café conilon. Embora o processo de liberação manual tenha sido laborioso, ele observou uma diminuição significativa das pragas ao longo dos anos, destacando a importância da constância e do tempo para obter resultados eficazes.

A aplicação foi feita manualmente em ziguezague no meio da lavoura, em pontos aleatórios, seguindo as distâncias recomendadas pelos técnicos. Bada sabe que a liberação também pode ser feita via drones, mas esse serviço não está disponível na região. Além disso, a área inicial de 2,5 hectares era pequena e inviabilizava o uso dessa tecnologia, conta. Na segunda aplicação, ele aumentou as áreas tratadas e continuou com o método manual devido aos resultados positivos, sempre realizando a liberação no período da tarde. O produtor percebeu que os crisopídeos começaram a se multiplicar naturalmente em sua plantação.

Um problema que enfrentou foi a aquisição das larvas do crisopídeo de Minas Gerais que, devido à distância e ao risco de atrasos nos Correios, exigiam um procedimento rápido para não perder o produto.

Sobre a eficácia, Ítalo observou que os inseticidas tradicionais produzem resultados mais rápidos, em cerca de cinco a seis dias, enquanto o controle com crisopídeo é mais lento. No primeiro ano, foi necessário usar outro produto biológico para controlar a praga. No segundo ano, houve uma diferença significativa, e em 2024, não precisou aplicar defensivos químicos.

O cafeicultor e agrônomo acredita que grande parte desse resultado se deve ao crisopídeo, que ajudou a estabelecer um controle natural das pragas. Ele não enfrentou problemas com cochonilha nas áreas tratadas com os insetos e reforça aos cafeicultores que o resultado depende do tempo e da consistência nas aplicações, embora ainda haja ceticismo entre alguns produtores.

“É necessário prazo para ter resultado. Nos últimos dois anos, o biológico vem mudando para melhor a cafeicultura na nossa região. Mas ainda tem gente que me chama de doido por colocar inseto para comer inseto. Um dia esse interesse aumenta. É bom acompanhar as datas certas de aplicação para fazer um controle eficiente”, finaliza.

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