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Tecnologia, inovação e conscientização são as armas contra a estiagem

Com mais de 20 municípios em situação de emergência devido à longa estiagem, o secretário de Agricultura do Estado, Otaciano Neto...

por Redação Conexão Safra

em 21/10/2015 às 0h00

13 min de leitura

Tecnologia, inovação e conscientização são as armas contra a estiagem


Redação
Estado


SECRETÁRIO DE AGRICULTURA AVALIA O MOMENTO DIFÍCIL DO ESTADO EM MEIO À CRISE HÍDRICA


Com mais de 20 municípios em situação de emergência devido à longa estiagem, o secretário de Agricultura do Estado, Otaciano Neto, faz uma avaliação do delicado momento vivido pelo homem do campo e a ameaça real da falta de água na região metropolitana.

O secretário aposta em tecnologia e inovação para combater o desperdício e ampliar a conscientização sobre a importância da água.

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Como o senhor avalia a atual crise hídrica que os capixabas estão vivenciando?

Há quatro anos registramos chuvas abaixo da média histórica no Espírito Santo. Muito provavelmente estamos vivendo a pior estiagem de nossas vidas. A situação assume contornos ainda mais graves se levarmos em consideração que o Estado possui dois terços de seu território com déficit hídrico. E o que é ainda mais preocupante: há um déficit de infraestrutura hídrica para a reservação de água. Temos limitações para armazenar a água no período das chuvas, por exemplo, e utilizar essa reserva nos períodos de estiagem. O uso inadequado do solo e da água foi um erro de toda uma geração. Nas décadas de 50, 60 e 70, acreditava-se que para se produzir mais alimentos precisávamos desmatar, abrir fazendas. Não houve foco em investimentos em pesquisa, ciência e tecnologia para ampliar a produtividade. Ou pelo menos demorou muito. Agora, mais do que nunca, temos que, todos juntos, ajustar o que achávamos certo no passado. Uma de nossas prioridades para os próximos anos será a construção de barragens de médio e grande porte. Iremos colocar em funcionamento mais de 60 novas barragens em todas as regiões do Estado, o que representa um investimento superior a R$ 60 milhões.


E o senhor acredita que essa nova mentalidade em relação à produção sustentável está mudando?

Sem dúvida que está! Vivemos uma mudança de paradigma em relação à agricultura praticada há 30, 40, 50 anos. E o produtor começou a ver cotidianamente o problema da falta de água. Nos debates que temos feito por todo o Estado para a elaboração do Plano Estratégico de Desenvolvimento da Agricultura Capixaba, o Pedeag 3, mais do que asfaltamento de estradas e máquinas, temos recebido inúmeros pedidos para acelerar os investimentos em pesquisa e no desenvolvimento de novas tecnologias e variedades genéticas. A agropecuária do século XXI possui dois grandes desafios: a sustentabilidade e a constante inovação tecnológica. Sem esses dois pilares será impossível atender à crescente demanda de produção de alimentos, fibra e energia renovável. Portanto, nossa tarefa, desde já, é aumentar a produtividade e a qualidade, diminuindo a área cultivada. E graças à adoção de práticas de manejo sustentáveis e ao trabalho de pesquisa e extensão rural desenvolvido pelo Incaper, isso já vem ocorrendo em algumas culturas, como é o caso do café arábica: de 2004 a 2015 houve uma redução de 50 mil hectares na área plantada de arábica no Espírito Santo. No mesmo período, a produtividade média passou de 12 sacas por hectare para 19 sacas por hectare.


A agricultura sempre é apontada como a grande vilã da crise hídrica. Isso corresponde à realidade?

Não cabe a nós procurar culpados, o momento é de esforço coletivo, de buscar minimizar os impactos que essa seca vem trazendo para todos os capixabas, sejamos produtores rurais, consumidores nas nossas casas, indústrias, governo ou prefeituras. Dados da ONU indicariam que a agricultura utiliza 70% da água disponível, mas esses dados não refletem necessariamente a realidade brasileira e de suas múltiplas regiões. O certo é que a maior parte da água utilizada no campo permanece no ciclo hidrológico, seja penetrando no solo e recarregando o lençol freático, seja sendo devolvida pela atmosfera pela evaporação da água no solo e nas plantas ou seja escoando para os cursos d’água. Na verdade, nossa geração está recebendo o ônus das políticas de desenvolvimento rural equivocadas, que chegavam a incentivar o desmatamento como forma de expandir a fronteira agrícola. O momento não é o de procurar vilões ou culpados. Agora é o momento do esforço coletivo. Precisamos da mobilização de toda a sociedade. Governos, prefeituras, cidadãos, indústrias, produtores rurais, todos têm a sua contribuição a dar para que os impactos negativos dessa grave estiagem sejam minimizados.


Quais os impactos para o setor agropecuário capixaba?

É bom lembrar que estamos vivendo o segundo pico da crise hídrica em pouco mais de seis meses. Toda a sociedade está sendo afetada, mas a situação do setor agropecuário capixaba é ainda mais difícil. Nos primeiros meses do ano chegamos a estimar um prejuízo superior a R$ 1,7 bilhão no setor, sendo que as atividades mais prejudicadas são a cafeicultura, a pecuária e a fruticultura. Estamos realizando novos levantamentos sobre os impactos econômicos da seca para a agropecuária e em breve iremos divulgar esses números. O Governo do Estado tem procurado agir de forma rápida. Queremos ficar o mais próximo possível dos nossos produtores. Ainda em fevereiro, articulamos junto com as instituições que operam crédito agropecuário no Espírito Santo (Banco do Brasil, Banestes, Bandes, Banco do Nordeste, Caixa, Sicoob e Cresol) a possibilidade de que os produtores rurais pudessem discutir a prorrogação e a renegociação de suas dívidas individualmente. Também liberamos o abate de vacas prenhas nos últimos três meses de gestação. A iniciativa atendeu a um pedido da Federação da Agricultura e Pecuária do Espírito Santo (FAES) e de proprietários de frigoríficos e teve a finalidade de minimizar as perdas do setor pecuarista capixaba. Temos orientado os produtores a procurar os escritórios do Incaper e do Idaf espalhados por todo o estado. Nesse momento de crise, o trabalho de assistência técnica e de extensão prestado por nossas instituições assume uma importância ainda maior. Possuímos pacotes tecnológicos que foram desenvolvidos ao longo dos últimos anos e que estão à disposição para ajudar os produtores a enfrentar as adversidades climáticas.


Recentemente, a Agência Estadual de Recursos Hídricos editou um conjunto de resoluções restringindo a captação de água para atividades industriais e irrigação em todo o Estado e declarando novamente Cenário de Alerta diante do prolongamento da estiagem. Essas medidas foram realmente necessárias?

Sem dúvida! A Política Nacional de Recursos Hídricos prioriza o abastecimento humano e a dessedentação dos animais em caso de escassez de água. E é essa realidade que estamos enfrentando aqui no Estado. De acordo com as resoluções da Agerh, em todos os municípios capixabas a captação de água das 5 horas às 18 horas está permitida apenas para o abastecimento humano. Nas localidades dos municípios em situação extremamente crítica a proibição se estende no período noturno, ou seja, a captação de água desses mananciais só pode ser feita para o abastecimento humano. Ao todo já foram editadas quatro resoluções. A resolução 005/2015 declarou Cenário de Alerta e proibiu a construção de novos poços escavados, a captação em poços escavados localizados a menos de 300 metros de um corpo hídrico superficial e a perfuração de poços artesianos, exceto quando destinados ao abastecimento humano. Essa resolução também trouxe a recomendação para que as instituições de fomento ou de crédito agrícola suspendessem as operações para a implantação de novos sistemas de irrigação e para a ampliação de sistemas já existentes. O documento recomendou, ainda, às Companhias Públicas e Privadas e aos Serviços Autônomos Municipais de Água que reduzissem o fornecimento de água para grandes usuários industriais.


A resolução 006/2015 estabeleceu regras e condições de restrição de captação e uso de água para os municípios que estão em situação extremamente crítica. Na semana passada eram nove municípios. Esta semana esse número subiu para 15 municípios. Na verdade, as medidas restritivas atingem apenas parte desses municípios, precisamente os locais situados à montante dos pontos de captação de água para o abastecimento humano dos mananciais em pior situação. Nesses locais, a captação de água para qualquer outro fim que não seja o abastecimento humano e animal, como a utilização da água para fins industriais e para irrigação, está totalmente suspensa por 15 dias.


E com relação às duas novas resoluções divulgadas esta semana pala Agerh? Elas trouxeram avanços?

As Resoluções 007 e 008/2015 estabelecem novas regras para a inclusão e exclusão da condição de extrema criticidade, tanto por município, quanto por indústrias, valorizando acordos locais firmados entre os usuários de água das bacias hidrográficas capixabas. Na prática, essas novas resoluções descentralizam a decisão sobre a utilização da água nos mananciais dos locais em situação extremamente crítica. Criamos um instrumento inédito no Estado, o Acordo de Cooperação Comunitária, pelo qual, no âmbito dos Comitês de Bacias Hidrográficas, prefeituras, produtores, sindicatos rurais, cooperativas e indústrias podem celebrar acordos sobre a utilização dos recursos hídricos. A premissa desses acordos é garantir a prioridade para o abastecimento humano. Dessa forma, estamos possibilitando que os setores produtivos tenham uma porta de saída para diminuir as restrições na captação de água. A resolução 007/2015 abre espaço para que sejam feitos acordos entre os diversos usuários dos mananciais dos municípios em situação extremamente crítica. Com esses acordos, que precisam ser homologados pela Agerh, esses municípios poderão deixar de ser enquadrados como em situação extremamente crítica e o setor produtivo terá menos restrições para captar a água. A resolução 008/2015 estende a possibilidade de que as indústrias de todo o Estado que fazem a captação direta nos mananciais, e que hoje só podem fazer a captação no período noturno, também formalizem acordos no âmbito dos Comitês de Bacias para que possam captar água em outros períodos do dia. As duas novas resoluções da Agerh nasceram a partir da visita feita pelo Comitê Hídrico Governamental aos locais mais atingidos pela seca no Norte do Estado, na semana passada. E, nesta quinta-feira, os municípios de Pinheiros, Boa Esperança e Conceição da Barra formalizaram acordos para utilização de seus mananciais, que já foram encaminhados para a homologação da Agerh.


Paralelo a essas medidas de restrição, o que o Governo vem fazendo para minimizar os impactos da estiagem e aumentar a segurança hídrica do Estado?

A superação da presente crise passa pela mobilização de todos nós: produtores rurais, indústrias, entidades públicas, organizações não governamentais e consumidores finais. Cada um desses segmentos tem sua contribuição a dar. É preciso que haja um esforço coletivo para promover ações de curto, médio e longo prazo, com a finalidade de garantir a preservação e a recuperação dos mananciais hídricos e a produção de água para toda a sociedade. De nossa parte, estamos empenhados em colocar em prática um plano de adaptação às mudanças climáticas, priorizando a ampliação da cobertura vegetal, da reservação de água e do saneamento básico.
Um trabalho que envolve a participação de vários órgãos governamentais e requer a mobilização da sociedade civil organizada, sobretudo dos Comitês de Bacias Hidrográficas, que são fundamentais para o equilíbrio dos interesses econômicos, sociais, ambientais e políticos em relação ao uso da água. As diretrizes adotadas pelo Governo do Estado no Planejamento Estratégico 2015-2018 para as áreas de Meio Ambiente e Agricultura preveem a construção de mais de 60 novas barragens, o que representa um investimento superior a R$ 60 milhões, e a ampliação da cobertura vegetal em 80 mil hectares. Com relação à captação de água nos rios, o objetivo é ampliar o volume de água reservada em 100 milhões de metros cúbicos, que serão distribuídos em barragens públicas e privadas por todo o Espírito Santo. Além disso, o programa Águas e Paisagens, anunciado recentemente pelo governador Paulo Hartung, vai possibilitar investimentos de mais de R$ 1 bilhão em saneamento básico, na ampliação da preservação e conservação das margens de rios e regiões de nascentes e na ampliação da cobertura vegetal em áreas estratégicas. Há poucos dias, estivemos em Pinheiros e anunciamos que o Governo do Estado irá concluir as obras da maior barragem do Espírito Santo, um projeto que se arrasta há 12 anos, e que vai beneficiar a população de Pinheiros e de Boa Esperança. São 268 campos de futebol de área alagada. Ela é era uma parcria da prefeitura de Pinheiros com o Ministério da Integração Nacional e foi por isso que o governador nos orientou a assumir o compromisso com a região de que vamos concluir essa obra.


O Governo pretende fortalecer os Comitês de Bacias?

O Governo quer fortalecer os processos decisórios dos Comitês de Bacias Hidrográficas para buscar soluções compartilhadas que possibilitem a redução do consumo de água. Cabe aos comitês de cada bacia hidrográfica a definição das regras para o uso da água, levando em consideração as necessidades de todos os setores que consomem ou exploram a água, incluindo a indústria, a agricultura, a produção de energia e a utilização para fins domésticos, tanto nas zonas urbanas como nas rurais. É no âmbito dos Comitês de Bacias Hidrográficas, órgãos colegiados, deliberativos e normativos, com representantes dos variados segmentos da sociedade, que se dará uma das discussões mais urgentes a fazer a partir de agora, relacionada à outorga e à cobrança pelo uso da água. A outorga é um dos instrumentos primordiais no processo de gestão de recursos hídricos, uma vez que assegura o controle dos usos da água, possibilitando sua divisão mais justa e equilibrada. Condicionado à outorga, temos a cobrança pelo uso da água, instrumento ainda pouco discutido e nada aplicado em rios de domínio do Estado. A cobrança foi criada como forma de reconhecer o valor econômico da água, incentivando seu uso de maneira racional, além de ser uma ferramenta eficaz na obtenção de recursos que podem ser utilizados, por exemplo, na recuperação de APPs, na despoluição da bacia, na elaboração de estudos e planos, etc. Estamos trabalhando para promover a desburocratização das outorgas, a partir da melhoria de seus processos.
Temos empenhado esforços no aperfeiçoamento dos aspectos técnicos que regem as autorizações. Quanto à cobrança, há diversos argumentos contra e a favor.
No entanto, ela é um instrumento primordial na gestão hídrica. Cabe ressaltar que nas bacias hidrográficas onde já se cobra pelo uso da água os valores são muito pequenos se considerados isoladamente (por usuário). Mas, juntos, se tornam fundamentais para a sobrevivência da própria bacia.

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