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Produtor de pimenta troca estaca por planta indiana e vira referência

Hoje é dia de relembrar a trajetória do pipericultor de São Mateus que testou o plantio de pimenta- do- reino no tutor vivo da Moringa e transformou o cultivo da especiaria

por Rosimeri Ronquetti

em 24/08/2023 às 6h00

10 min de leitura

Produtor de pimenta troca estaca por planta indiana e vira referência

Em busca de melhor qualidade de vida e de manter os filhos na propriedade rural, o agricultor Claudionor Luiz Ferreira, 56 anos, de São Mateus, Norte do Espírito Santo, fez algo inédito no cultivo da pimenta-do-reino. Em vez de plantar a especiaria da maneira convencional, usando estacas para apoiar a planta, usou a Moringa. O resultado, como ele mesmo garante, “foi melhor que o esperado ”.

Originária da Índia, a planta chegou ao Brasil na década de 1960 e foi descoberta por Claudionor há cerca de quatro anos. Naquela época, o produtor já tinha na propriedade, localizada na comunidade Santa Terezinha, no Km 30 da BR-381, que liga São Mateus a Nova Venécia, o plantio da pimenta-do-reino em tutor vivo de Neem Indiano (Azadirachta indica A. Juss), popularmente conhecido por “Nim”.

“Eu queria plantar mais pimenta. Buscava alternativas para manter meus filhos na roça e dar a eles condições melhores, já que não pude dar estudo. Só que não tinha como começar a plantar devido ao custo de produção. Comecei com Nim e quando conheci a Moringa resolvi testar. Graças a Deus deu muito certo. Descobri que a Moringa é muito melhor e mais vantajoso que o Nim, que a estaca então nem se fala ”, comenta o produtor.

No Sítio Bamburral, onde mora e trabalha no regimento de agricultura familiar com os três filhos, dois deles já casados, são 18 mil pés de pimenta. Destes, 7.500 estão no tutor vivo da Moringa e foram plantados há três anos e meio. Entre as vantagens da Moringa estão a redução nos custos de produção. Enquanto uma estaca custa entre R$ 6,00 e R$ 12,00, dependendo da região, a muda da Moringa não passa de R$ 2,00.

Outra vantagem importante, segundo o produtor, é que a Moringa faz sombra em cerca de 30% a 40% do terreno onde está plantada, o que consequentemente diminui a quantidade de mato na roça e reduz o custo de mão de obra, além de ajudar segurar a pimenta no pé, diminuindo as perdas de produção.

Dos pés da Moringa caem muitas folhas, flores e galhos, que no chão se transformam em uma rica camada de matéria orgânica. Esse material, associado ao grande número de minhocas, propiciado também pela presença da Moringa, ajuda na preservação do solo e na adubação da pimenta. Esse processo, juntamente com a sombra, deixa o solo mais úmido e fresco, reduzindo quase que pela metade a necessidade de irrigar a lavoura.

Outros dois diferenciais relacionados ao uso da Moringa estão na produtividade e o tempo de vida dos pés de pimenta. “Plantados na estaca, os primeiros pés de pimenta começam morrer com dois anos e meio, três anos, e duram no máximo seis, dependendo do solo onde está plantada. Na Moringa, ela não morre fácil. Minha roça já tem três anos e meio e não morreu nenhum pé. A produção também é maior. O pé de pimenta segura melhor a florada, devido à sombra, e também fica maior do que na estaca, da altura que o produtor quiser, consequentemente vai produzir mais ”, explica o produtor.

 

Tutor vivo é bom? Qual o melhor?

Em busca dessa resposta, o pesquisador em Genética e Melhoramento de Plantas do Instituto Capixaba de Pesquisa, assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), Lúcio de Oliveira Arantes está escrevendo um projeto de pesquisa em busca de recursos para iniciar os trabalhos de investigação sobre tutor vivo para pimenta-do-reino.

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O objetivo do pesquisador é avaliar a Moringa, o Nim, a Gliricídia, todos tutores vivos, e o eucalipto tratado como tutor morto. “É importante experimentar diversos tutores e avaliá-los por meio de experimentos, a fim de recomendar os mais promissores aos agricultores, avaliar a economia de água, redução de uso de agroquímicos, maior reciclagem de nutrientese talvez colher grãos de maior qualidade ”, explica Arantes.

Apesar dos estudos sobre os benefícios da Moringa usada como tutor vivo estarem no início, o engenheiro agrônomo e mestre em Agricultura Tropical, Welington Secundino, diz que o plantio da pimenta nos tutores vivos já é uma realidade e a Moringa tem se mostrado muito promissora.

“O plantio em tutores vivos é uma realidade e traz consigo o benefício da economia e da sustentabilidade. A Moringa mostra-se muito promissora, devido a sua rapidez no crescimento e uma área foliar menos densa que o Nim e a Gliricídia, o que evita a mão de obra com podas ”, aponta Secundino.

O engenheiro diz ainda que estão sendo utilizados diversos tutores vivos, como a Gliricídia, já estudada e recomendada pela Embrapa, o Neem Indiano, o Coqueiro e a Moringa, que são experiências dos próprios produtores na busca de condições para continuar na atividade, como fez o Claudionor.

“Um laboratório demora de três a cinco anos para pesquisar, testar e aprovar um estudo desses, por isso resolvi testar. Não tive medo de errar e graças a Deus deu certo. De repente se eu não tivesse essa iniciativa nunca ninguém ia descobrir que a Moringa é um tutor vivo tão bom ”, destaca Claudionor.

O engenheiro agrônomo e mestre em Agricultura Tropical, Welington Secundino. (*Foto: Arquivo pessoal)

Produtores investem no uso do tutor vivo da Moringa

Cerca de 50 produtores já aderiram ao tutor vivo da Moringa. Entusiasmado com os resultados alcançados por Claudionor na roça de pimenta-do-reino, o comprador e exportador da especiaria, Arildo Eulálio dos Santos, de São Gabriel da Palha, adquiriu um terreno e vai investir no plantio de 30 mil mudas de pimenta com a Moringa.

“Nunca tive vontade de plantar pimenta, e só vou investir porque é na Moringa. Na estaca jamais plantaria. Já conheço a Moringa há algum tempo, também fiz alguns testes e conheço a roça do Claudionor, por isso resolvi comprar o terreno e investir ”, declara.

Arildo disse ainda que fez as contas. O custo de produção com a estaca é de R$30,00 por pé de pimenta, já na Moringa cai para R$ 10,00. Um custo muito alto, segundo ele, e que dura muito pouco tempo.

Arildo Eulálio dos Santos, de São Gabriel da Palha, adquiriu um terreno e vai investir no plantio de 30 mil mudas de pimenta com a Moringa. (*Foto: Arquivo pessoal)

Diferente de Arildo que nunca cultivou pimenta-do-reino, o agricultor Evilázio Sartório Altoé, da comunidade de Fátima, em Jaguaré, tem cerca de 90 mil pés da planta e também prepara o solo para plantar mais 30 mil mudas usando a Moringa. “Vejo na Moringa um caminho para uma agricultura mais moderna e uma alternativa para baratear os custos de produção. Se der resultados como espero vou trocar toda minha plantação da estaca para Moringa ”, diz Altoé.

Evilázio explica ainda que já fez plantio com estaca e também no arame, mas, além de ser muito trabalhoso, tem ainda o problema do cupim que come as estacas. A vida útil é muito curta e o risco da lavoura se acabar em pouco tempo e não cobrir os custos é muito grande.

 

Vizinho de Claudionor, Sidiclei Rossini Bernini há dez anos planta pimenta na estaca e agora vai cultivar 3.600 mudas na Moringa. O produtor cultiva quatro hectares de pimenta e vai ocupar 1,5 ha com a Moringa. Com o tempo, Sidiclei pretende substituir todo terreno. “Acompanho o Claudionor desde que ele começou essa experiência e sei que dá certo, por isso resolvi mudar. Esse para mim é o melhor jeito de plantar pimenta-do-reino, tanto pela economia, como o sombreamento, e também pelo reflorestamento ”.

Claudionor conta que recebe pessoas de vários municípios que vão conhecer de perto sua plantação. Usando a própria roça como referência, ele construiu um viveiro e começou a produzir e vender mudas de Moringa. Já são mais de 100 mil vendidas para municípios vizinhos como: Jaguaré, Linhares, Conceição da Barra e São Gabriel da Palha. Sementes da espécie também já foram enviadas para Rondônia e Pará.

O produtor colhe as sementes e faz as mudas direto na sacolinha. Com 40 dias, a muda já pode ser plantada na roça. De quatro a seis meses após o plantio da Moringa já pode ser feito o plantio da pimenta.

Vizinho de Claudionor, Sidiclei Rossini Bernini há dez anos planta pimenta na estaca e agora vai cultivar 3.600 mudas na Moringa.

Financiamento rural para plantio da Moringa

Quando Jan Carlos de Sousa Costa, agricultor e sócio de uma empresa de consultoria rural em São Mateus e região viu pela primeira vez a Moringa, resolveu conhecer melhor a espécie. Para isso buscou informações na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa Nordeste), onde já existem várias pesquisas sobre o uso da planta.

Tempos depois, visitando a propriedade do Claudionor para comprar mudas de pimenta-do-reino, Jan descobriu o uso da Moringa para o plantio de pimenta e há um ano decidiu fazer um projeto no Banco do Brasil para financiar o cultivo da especiaria com a Moringa.

“Já conhecia a Moringa e sabia do potencial e utilidade da planta em várias áreas. Quando vi plantada com a pimenta resolvi fazer o projeto para tentar aprovar uma linha de crédito e deu certo ”, conta Jan.

Usando a própria roça como referência, Claudionor Ferreira construiu um viveiro e começou a produzir e vender mudas de Moringa. Já são mais de 100 mil vendidas para municípios vizinhos.

Aprovado há cerca de quatro meses, o financiamento já é uma realidade e pode ser feito em duas modalidades. Com o plantio da pimenta-do-reino e a Moringa, com três anos de carência e sete anos para pagar. Essa modalidade é feita pelo Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).

A outra opção é o plantio da pimenta-do-reino com a Moringa e mais uma terceira cultura, como o café ou a banana, por exemplo. Nesse caso, são 20 anos para quitar o financiamento.

O primeiro financiamento para o plantio da pimenta com a Moringa no Espírito Santo foi feito por Arildo para 30 mil mudas de pimenta consorciada com a Moringa. “Considero essa uma planta de Deus em que vale muito a pena investir e financiar para plantar. Por isso resolvi fazer o projeto para tentar aprovação da linha de crédito, e deu certo, conta o produtor que já prepara o terreno para o plantio da Moringa.

Jan Carlos também entrou com projeto para o financiamento no Banco do Nordeste e aguarda aprovação.

 

Uma planta, várias utilidades

Estudos realizados pela Embrapa do Mato Grosso classificam a Moringa, espécie da família Moringaceae, cultivada em todas as regiões tropicais e subtropicais do mundo, como uma árvore de usos múltiplos. Conhecida também como “&Aacute,rvore da Vida ”, serve para alimentação animal de bois, cabras, ovelhas, porcos e galinhas e pode ser fornecida fresca, fenada ou ensilada.

Planta apícola, produz flores durante boa parte do ano e pode ser considerada uma fonte constante de néctar para abelhas. Das sementes extrai-se óleo de excelente qualidade, com perfil de ácidos graxos similar ao óleo de oliva, utilizado em cosméticos, alimentos, medicamentos e na produção de biodiesel.

Considerada uma Planta Alimentícia Não-Convencional (Panc), a Moringa também pode ser utilizada para alimentação humana. Suas folhas possuem elevado teor de proteínas, são ricas em aminoácidos essenciais, minerais, vitaminas e substâncias antioxidantes, constituindo-se em um alimento funcional altamente nutritivo.

Um dos filhos de Claudionor, Claudinei Mariane Ferreira, conhece todos esses benefícios e diz que já existem na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estudos para liberar o uso da folha da Moringa para produção de suplemento alimentar, e que só aguarda essa liberação para começar a fabricar.

“Já existem vários laboratórios no país e também fora que estudaram e comprovaram os benefícios da folha da Moringa. Assim que a Anvisa liberar vou investir na produção do suplemento alimentar para vender em farmácias e lojas de produtos naturais. Vou fazer da Moringa mais uma fonte de renda ”, conta Claudinei.

O material orgânico, juntamente com a sombra, deixa o solo mais úmido e fresco, reduzindo quase que pela metade a necessidade de irrigar a lavoura.

 

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