Logística

Do campo ao porto: desafios logísticos na exportação do algodão baiano

A expertise e a tradição do cultivo da fibra na Bahia encontram-se agora com a infraestrutura e a logística em evolução, apontando para um futuro de crescimento e prosperidade para os produtores

por Leandro Fidelis

em 22/05/2024 às 5h00

8 min de leitura

O Banco do Nordeste desempenha papel fundamental no apoio ao desenvolvimento da cotonicultura na região, fornecendo financiamento e suporte técnico para os produtores. (*Foto: Fernando Cavalcante/Divulgação BNB)

O setor de cotonicultura na Bahia enfrenta desafios logísticos que afetam sua competitividade no mercado internacional. Produtores, representantes do setor e autoridades discutem a necessidade de diversificar as rotas de exportação do algodão, buscando reduzir custos e aumentar a eficiência. O Porto de Salvador surge como alternativa viável, oferecendo vantagens logísticas e estrutura adequada para atender às demandas do mercado. A expansão do uso do terminal para exportação de algodão pode impulsionar o setor e contribuir para o desenvolvimento econômico do Oeste baiano.

Além dos desafios logísticos, a cotonicultura também encontra obstáculos relacionados à infraestrutura de transporte interno. A falta de estradas adequadas e a deficiência na conexão entre as áreas de produção e os portos marítimos impactam negativamente o escoamento da safra e aumentam os custos de transporte. Investimentos em infraestrutura viária, como a melhoria de rodovias e a construção de ferrovias, são necessários para otimizar o transporte do algodão, tornando-o mais eficiente e competitivo no exterior.

A produção de algodão no Brasil é peça fundamental no cenário global, com Mato Grosso e Bahia destacando-se como os principais Estados produtores. Juntos, são responsáveis por 90% do total nacional. A dinâmica do mercado global também exerce influência, como evidenciado pela correlação entre a alta do petróleo e o aumento da demanda por fibras naturais, impulsionando os preços do algodão. Prevê-se que o Brasil, já o quarto maior produtor mundial, ascenda ao terceiro lugar na safra 2023/24, com uma produção estimada de 3,06 milhões de toneladas. Esse crescimento é impulsionado principalmente por Mato Grosso, Bahia, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Minas Gerais, com destaque para o primeiro Estado, que produz mais que a soma dos demais. No entanto, entre os dois períodos avaliados, houve uma redução significativa nas exportações, reflexo das incertezas econômicas globais e da desaceleração da demanda externa. Os dados são do Caderno Setorial do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene) do Banco do Nordeste (BNB), de dezembro de 2023.

China, Bangladesh, Vietnã, Coreia do Sul e Turquia destacam-se como os principais destinos das exportações brasileiras de algodão, representando 80% do total exportado em peso e valor. Na Bahia, os produtores estão otimistas, prevendo um aumento significativo da área plantada, impulsionado pelos resultados positivos da última safra e pela substituição de culturas menos lucrativas, como o milho. Embora haja registro de chuvas significativas em novembro, as condições climáticas ainda são um fator determinante para o sucesso da safra.

“A Bahia é o segundo produtor e exportador brasileiro de algodão. E a cotonicultura baiana é responsável pelo segundo Valor Bruto da Produção (VBP) agropecuário do Estado, desde 2018, com previsão de R$ 5,2 bilhões para 2024. É uma atividade que gera emprego e renda tanto na produção empresarial quanto na familiar, recebendo apoio do Banco do Nordeste por meio de financiamento de investimento e custeio, para os diferentes portes de produtores”, destaca o economista Jackson Dantas Coêlho, mestre em Economia Rural e coordenador de Estudos e Pesquisas do BNB.

A estruturação da cadeia ajudou na melhoria econômica e social de municípios do semiárido e dos cerrados, a exemplo do Oeste baiano. Segundo Coêlho, o Banco do Nordeste também financiou projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PDI) e a transferência de tecnologias, bem como realizou inúmeras pesquisas sobre a cotonicultura nordestina, analisando os aspectos de manejo da cultura e de beneficiamento do algodão, produção de fibra e derivados, além das formas de comercialização. E desde então publica análises setoriais periódicas, de acompanhamento de mercado, sobre a produção da fibra.

A logística continua sendo um desafio para os produtores de algodão na Bahia, onde a infraestrutura de transporte ainda precisa de melhorias para reduzir custos e aumentar a competitividade regional. A Associação Nacional dos Exportadores de Algodão (Anea), em parceria com a Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), está empenhada no projeto “Cotton Brazil”, buscando abrir novos mercados e fortalecer os existentes por meio de ações de comunicação, marketing e missões internacionais. O objetivo é enfrentar o desafio de exportar 2,48 milhões de toneladas de pluma, consolidando a posição do Brasil como um dos principais players do mercado global de algodão.

Com uma produção voltada principalmente para o mercado asiático, os Franciosi buscam ampliar as áreas irrigadas, investindo em quase 30 mil hectares de algodão irrigado neste ano, visando à maior eficiência e qualidade. (*Fotos: Divulgação)

Produtores sob pressão

Cotonicultores como Paulo Almeida Schmidt e Ana Paula Francioni estão inseridos em uma rede intrincada de cultivo, logística e exportação, moldada por décadas de tradição familiar e pelas demandas do mercado. Desde os anos 1980, os Schmidt têm trabalhado nas vastas terras dos municípios de Luiz Eduardo Magalhães, Barreiras e Formosa do Rio Preto, cultivando não apenas algodão, mas também cacau, banana, soja e milho.

Com mais de 10 mil hectares dedicados ao algodão, a família Schmidt enfrenta um um duplo desafio: manter a competitividade em um mercado global altamente exigente, lidando com as limitações logísticas que afetam a exportação, especialmente em relação aos portos de escoamento, e ainda permanecer na atividade e gerando empregos.

“Um dos grandes gargalos é não conseguir exportar todo o algodão da Bahia pelo Porto de Salvador porque fica mais caro que por Santos. Nós produtores somos muito bons da porteira para dentro e estamos fazendo nossa parte. Somos eficientes, mas perdemos competitividade para colocar a fibra no exterior”, analisa Paulo Schmidt.

Enquanto isso, a busca por práticas sustentáveis e a participação em programas como o ABR Sustentabilidade demonstram um compromisso crescente com a responsabilidade socioambiental, em consonância com os padrões internacionais. Para o cotonicultor, é uma maneira de padronizar todos os produtores brasileiros com as melhores práticas socioambientais existentes não somente no Brasil, “que tem uma das legislações mais rigorosas do mundo. É um programa muito tranquilo, que levamos muito a sério. Gostamos porque, participando, sabemos que estamos fazendo o melhor que existe no mundo em termos de práticas socioambientais”.

Paulo Schmidt: “Nós produtores somos muito bons da porteira para dentro e estamos fazendo nossa parte. Somos eficientes, mas perdemos competitividade para colocar a fibra no exterior”.

Ana Paula Francioni, outra produtora do Oeste baiano, mais precisamente no Norte do município de Luiz Eduardo Magalhães e ao Sul do Estado Piauí, destaca as dificuldades enfrentadas pelos motoristas de caminhão, que evitam Santos devido aos longos períodos de espera, o que encarece o frete. Com uma produção voltada principalmente para o mercado asiático, Ana Paula busca ampliar as áreas irrigadas, investindo em quase 30 mil hectares de algodão irrigado neste ano, visando à maior eficiência e qualidade. Os pais chegaram à Bahia nos anos 1990 e encontraram um Luiz Eduardo Magalhães rudimentar e ainda distrito de Barreiras. Hoje, parte da segunda geração dos Francioni está envolvida na atividade, buscando consultoria para garantir a sucessão familiar.

Diante desse cenário, a cotonicultora ressalta os obstáculos na logística, especialmente a dependência do Porto de Santos e as dificuldades das estradas brasileiras. “É uma situação bastante complicada. Sem falar da questão das estradas que a gente sabe ser bastante complicada no Brasil, pois são perigosas. A longa espera dos motoristas no Porto de Santos se torna extremamente ineficiente para nossa cotonicultura. Alguém tem que pagar essa conta, do tempo que eles ficam lá parados, o que automaticamente gera aumento de custo”, avalia.

Ana Paula, que concedeu esta entrevista enquanto participava, juntamente com membros da Associação Baiana dos Produtores de Algodão (Abapa), de reuniões setoriais em Singapura, destaca a necessidade de diversificar os portos de exportação do algodão baiano, destacando o potencial do Porto de Salvador (*saiba mais na segunda parte desta reportagem amanhã). A produtora acredita que, superando os preços diferenciados e a resistência dos traders, é possível promover o desenvolvimento do setor e evitar a dependência exclusiva de um único porto.

“Viemos aqui nos aproximar dos compradores de algodão e mudar um pouco a imagem do produto brasileiro. Realizar a operação de exportação em outros portos é uma das medidas em discussão a serem implementadas. E, com isso, é claro, abordamos novas rotas, toda questão de estufagem, duplicação de estradas e acesso por via férrea, barreiras que precisam ser quebradas. A ferrovia em construção pode ajudar muito”, analisa a cotonicultora.

*Confira amanhã:

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