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Jovens estão de volta ao campo

Confira segunda parte da reportagem especial, capa da atual edição da Revista Safra ES

por Redação Conexão Safra

em 02/02/2018 às 0h00

9 min de leitura

Jovens estão de volta ao campo


A juventude é o link da roça com o futuro. A tecnologia e o desempenho positivo do setor agrícola nos últimos meses fizeram com que 10 mil jovens capixabas trocassem as cidades pela vida no campo, segundo estimativa do gerente de agroecologia da Secretaria de Estado da Agricultura (Seag), Marcus Magalhães.


Dentro desse universo, a maioria dos jovens é formada por recém-egressos das universidades e filhos de agricultores. A implantação de novidades nas propriedades rurais ainda é um desafio. Muitos precisam lidar com pais que não estudaram e ainda mantém modelos tradicionais na produção de alimentos.


O secretário de Estado da Agricultura, Octaciano Neto, destaca que a contribuição dos jovens está na ampliação da produtividade, na restauração dos recursos naturais e na geração de novas oportunidades. Para ele, a massificação do movimento de retorno ao meio rural será sentida nos próximos meses.


“Além das tecnologias disponíveis para os produtores rurais, o grande número de recém-formados vai acelerar o processo de informatização do campo. É um êxodo urbano. Ainda existe resistência, mas os pais já estão percebendo a necessidade de novas ideias para o desenvolvimento ”, avalia o secretário.

Para o governador, Paulo Hartung, o jovem rural conectado com o mundo provoca a evolução na qualidade dos produtos agropecuários. A rastreabilidade de produtos como o café, por exemplo, é um dos avanços do mundo moderno, aponta. “Vivemos em um mundo onde os consumidores querem saber cada vez mais como os alimentos foram produzidos. É esse mundo que está evoluindo, e nós precisamos conectar nossa agricultura. É preciso levar ciência, pesquisa aplicada para melhorar a produção no campo ”.



Café com tecnologia e planejamento

foto: divulgação



No noroeste do Estado, os irmãos Isaac (37) e Lucas Venturim (36), de São Gabriel da Palha, se destacam na produção de café conilon. O primeiro formou-se em administração rural e aplica seus conhecimentos na gestão da Fazenda Venturim, em São Domingos do Norte, enquanto Lucas, engenheiro civil, está à frente dos projetos de irrigação.


A propriedade tem mais de 20 anos no mercado de cafés, e há um ano lançou no mercado o Café Fazenda Venturim, marca de café tradicional, torrado e moído, torrado em grãos e em cápsula.


Isaac explica que o primeiro passo foi formar um parque cafeeiro uniforme, com quantidade significativa de café para viabilizar o projeto. Além disso, foi necessário mecanizar toda a área da fazenda para depois plantar café com irrigação. No final do planejamento, a ideia era trabalhar com qualidade. “Nosso pai já prezava a produção com qualidade, mas não tínhamos lavouras que favoreciam esse processo ”, lembra.


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Atualmente, os plantios contam com pés de café em diferentes estágios para garantir colheita mais cadenciada e melhor aproveitamento do processo. “Depois que atingimos produtividade e volume consideráveis, partimos para a pesquisa sobre qualidade a partir da experiência com o arábica nas montanhas ”, conta Isaac.


Em 2012, os Venturim adquiriram equipamentos para seleção dos grãos e construíram um galpão maior. Hoje, com essa estrutura e foco na colheita seletiva, os cafeicultores alcançam surpreendentes 85% de grãos de cereja descascado. “Nosso parque cafeeiro tem capacidade para colher de 5.000 a 6.000 sacas de café. “Não queremos descascar café verde, preferimos fazer o cereja para poder alcançar melhores notas na bebida ”.


Ainda no processo para obtenção de cafés finos, a família foi uma das primeiras da região a secar os grãos em forno a fogo indireto. Por conta dessas inovações, há cinco anos os Venturim ficam entre os primeiros colocados em concursos de qualidade de café conilon. Em 2014, a família ficou em 2º lugar no concurso nacional da Nestlé.


“Eu fico feliz de viver no meio rural. Há vinte anos, ninguém queria ficar na roça. Queria fazer direito ou medicina e seguir carreira na cidade. Fui um dos poucos netos que permaneceu no campo, e por isso era tido como maluco pelos amigos. Não é em toda família que se tem o apoio para levantar a propriedade. Isso serviu de exemplo para outros amigos, que me procuram para saber por quais caminhos passei para chegarmos onde estamos hoje ”, finaliza Isaac Venturim.



Sucessão familiar nas montanhas

foto: Leandro Fidelis



Venda Nova do Imigrante, na região serrana, sempre se diferenciou pelo retorno dos seus moradores após formados na cidade grande. A tradição foi motivada pelos colonizadores italianos, que devido às condições financeiras escassas, viam nos seminários religiosos a única forma de garantir a educação dos descendentes.


Como permanecer na roça e assumir o cabo da enxada era o terror para o jovem da época, muitos vendanovenses acabaram seguindo até o fim o caminho da vida religiosa, se tornando padres e freiras, enquanto outros não fizeram os votos de castidade, porém aproveitaram o tempo no seminário para conquistar o tão sonhado diploma.


E se antes ficar na roça era considerada péssima escolha, hoje o campo traz novas perspectivas de emprego e renda, quase sempre dentro do próprio quintal da família. É o caso dos Lorenção, na localidade de Tapera, zona rural do município. Quatro netos do casal Máximo Lorenção e Cacilda Caliman, pioneiros do agroturismo local, estão ao lado dos pais em dois empreendimentos agro.


Os irmãos Bernardo (33) e Graccieli (30) são a nova geração da família na fabricação artesanal do socol, presunto italiano maturado naturalmente, e dos antepastos do Sítio Lorenção. Enquanto ele agrega seu conhecimento técnico em agroindústria, Graccieli, recém-formada em Engenharia de Alimentos, busca se superar na produção sem conservantes.


“Ainda na faculdade, sempre tive foco em produtos sem conservantes e alcancei esse objetivo na própria família. Vou continuar batendo nessa tecla e, como engenheira, tenho capacidade para fazer muito mais dentro dos padrões de qualidade e segurança alimentar exigidos ”, aposta a jovem.


O irmão chegou a cursar a faculdade de química, mas com os negócios da família melhorando, fez a mudança para o técnico e se diz mais realizado. “O agroturismo é um ótimo setor. Fazendo um produto de qualidade, principalmente artesanal, que é muito valorizado hoje, as oportunidades são para todos ”, destaca Bernardo.


Na mesma localidade, os irmãos Hermano (23) e André Lorenção Meneguetti (27) participam da administração da empresa familiar Imigrante Comércio de Produtos Alimentícios, que completou dez anos em 2017. O carro-chefe dos negócios são os feijões dos tipos preto, vermelho e manteiga da marca “Produtos da Montanha ”. As sementes são catadas à mão por agricultores de várias regiões capixabas. Depois de embalados, os produtos vão para as prateleiras de importantes redes de supermercado do Estado e do Rio.


Formado em administração, André conta que chegou a estudar na capital, mas não se sentia à vontade na cidade grande. “Vi que poderia voltar e contribuir para a empresa da família crescer ”, diz.


Graças à persistência do jovem, o uso mais eficaz da internet, a aquisição de uma empilhadeira e de uma impressora para registrar a data de validade nas embalagens passaram a otimizar o tempo na empresa. “Detalhes que antes eram obstáculos junto aos meus pais e que hoje não vivemos sem ”.


Embora engenheiro civil recém-formado, Hermano diz não ter desistido de atuar na área, mas adiou os planos diante da crise imobiliária atual. “Voltei para somar nos negócios. O setor alimentício tem grande potencial e aplico meus conhecimentos para agregar de alguma forma à empresa ”, afirma.


Dono de uma mente lúcida e empreendedora, o agricultor Máximo Lorenção (88), avô dos quatro jovens, relembra a dificuldade de romper paradigmas na zona rural. “Em 1946, voltei do seminário em São Paulo pronto para promover mudanças na propriedade da família. Tive mais dificuldades que meus netos. Imagina eu naquela época falando de curvas de nível na cafeicultura? ”, diz.



União e boas ideias para produzir tomate


foto: Leandro Fidelis



No distrito de Alto Caxixe, também em Venda Nova, outros jovens promovem mudanças, aproximando a produção de tomate das novas tecnologias. São os irmãos Laisi (27) e Bruno Bellon Cesconetto (23) e o primo Leandro Gagno Cesconetto (21). Um trio pleno de ideias produtivas para os negócios dos pais.


Bruno é formado em agronomia e sempre vislumbrou fazer carreira no empreendimento familiar quando se formasse. “Nossa ligação com o campo é muito forte, a ideia era sempre continuar no meio. Os nossos pais precisam da gente para dar continuidade aos negócios ”, diz o agrônomo.


Já Laisi é engenheira ambiental, com mestrado na área e um doutorado em recursos hídricos e meio ambiente em curso, enquanto Leandro está se formando em administração. “Cada um tem uma função dentro do negócio ”, explica a jovem.


Os Cesconetto foram pioneiros no comércio de tomate junto às Centrais de Abastecimento do Espírito Santo (Ceasa) e hoje atuam em toda a Região Sudeste do país. Os herdeiros imprimem modernidade aos negócios, com a implantação de tecnologias para melhorar a produtividade e a gestão da propriedade.


Um exemplo é o uso do aplicativo Agroclima Pro, que gera boletins diários de temperatura, umidade, velocidade do vento, radiação e previsão de chuvas com antecedência de até seis horas. “Isso possibilitou melhor planejamento da adubação e pulverização. Já havíamos testado outros aplicativos não tão precisos. Hoje, a perda de defensivos é bem menor ”, afirma Bruno.


A família ainda se informa sobre o custo de produção de insumos com uso de um programa de controle de entrada e saída do estoque. “Isso ajuda a gente a proceder num cenário em que o preço da mercadoria vale menos que o custo de produção. Com um bom controle, você se torna mais competitivo ”, diz Bruno.


O primo Leandro destaca o primeiro ano de funcionamento da máquina eletrônica de beneficiamento de tomate. O equipamento está instalado no galpão da família e seleciona 48 frutos por segundo conforme a cor e o tamanho.


Segundo o jovem, regiões brasileiras maiores produtores de tomate que Alto Caxixe (líder na produção capixaba) ainda não utilizam a tecnologia. “O uso da máquina agrega mais valor para o produto, pois deixa o tomate mais padronizado para o mercado ”.


Para Laisi, a digitalização do campo é uma necessidade para tornar a atividade agrícola mais competitiva. “E o fato de a gente ter estudado faz com que tenhamos mais contato com outras pessoas, com outras experiências para a troca de informações ”, diz.


Aos 77 anos, o avô do trio, Érico Cesconetto (77) orgulha-se de sempre ter dado carta branca às ideias dos filhos Gerson e Genésio. “A gente fica feliz de ver a família grande, muitos netos formados e bem-sucedidos. Sempre fui uma pessoa com cabeça aberta para novidades na roça ”.


por Leandro Fidelis

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