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Vem aí uma cerveja de ‘pocar’

Dentro de dez dias, será lançada a “Hügel Bier Nativa”, a primeira cerveja artesanal feita a partir de insumos (cevada e lúpulo) 100% orgânicos e produzidos no Espírito Santo

por Leandro Fidelis

em 21/03/2024 às 0h01

10 min de leitura

Vem aí uma cerveja de ‘pocar’

Foto: divulgação

Matéria publicada originalmente em 30/03/2020

Em 2019, o número de cervejarias devidamente registradas no Ministério da Agricultura aumentou100% no Espírito Santo. A taxa de crescimento de estabelecimentos está na faixa de 77%, segundo o Anuário da Cerveja. Além disso, o Estado ocupa a 4ª colocação do país no ranking da densidade cervejeira, com uma cervejaria para cada 118.196 habitantes.

Apesar da expansão do setor, ainda não temos um produto genuinamente capixaba. Mas isto é questão de pouco tempo. Dentro de dez dias, será lançada a “H&uuml,gel Bier Nativa ”, a primeira cerveja artesanal feita a partir de insumos (cevada e lúpulo) 100% orgânicos e produzidos no Espírito Santo.

A novidade foi anunciada pelo agrônomo e cervejeiro Jacimar Souza (Incaper). Ele aproveitou as sobras da cevada Kalibrede experimentos agroecológicos realizados nos últimos dois anosna unidade Centro-Serrana do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural na Fazenda do Estado (Domingos Martins) para fabricar em casa 130 litros da bebida em barril.

A cerveja não será comercializada neste primeiro lote. Porém, o cervejeiro e pesquisador pretende distribuir 60 litros para interessados em degustar a novidade.

“É um fato pioneiro por utilizar insumos produzidos em terras capixabas. A cevada só vai ser realidade no Estado quando algum empresário perceber que mercado ficou grande e investir no projeto, uma vez que se trata de agricultura de larga escala e plantio mecanizado ”, avalia Jacimar Souza.

Jacimar Souza (ES) é o idealizador da bebida produzida com insumos 100% capixabas.

Como não existe maltearia no Espírito Santo, Jacimar desenvolveu uma malteação caseira, segundo ele não tão “complicada ”, para garantir o sabor desejado. O processo é feito em quatro etapas: maceração, germinação, secagem e crivagem (*Assista vídeo abaixo!)

O nome da cerveja segue a linha já fabricada e compartilhada por Jacimar entre outros cervejeiros da região. O pesquisador reserva outro barril em fermentação para o Festival de Cervejas Artesanais do Clube Recreativo Venda Nova (Creven), cuja 4ª edição, que aconteceria em junho, foi adiada para 18 e 19 de setembro por conta da pandemia do Coronavírus (Covid-19).

O evento deverá reunir dez cervejeiros e vai divulgar o trabalho do Incaper e mostrar o potencial cervejeiro do Espírito Santo aos participantes.

“A primeira cerveja feita com matéria-prima capixaba é um prato feito para a cultura do agroturismo que temos nas montanhas. Éum produto de alto nível, bem diferenciado… Por isto que as cervejas artesanais custam mais ”, diz.

 

 

Cevada ‘calibrada’

O pesquisador Jacimar Souza contou com apoio da Embrapa Trigo (Passo Fundo- RS) para testar a adaptabilidade de três variedades de cevada cervejeira à altitude de 950m. A que melhor mostrou potencial para a agricultura regional foi a Kalibre.

Uma amostra da cevada foi enviada ao laboratório da Embrapa onde passou por todos os testes para transformação em malte cervejeiro e apresentou padrão de qualidade e níveis de produtividade similares às cervejas do Sul do país.

Todas as cultivares obtiveram mais que 85% dos grãos classe 1 (maior que 2,5mm), poder germinativo acima de 95% e teores de proteína na faixa de 9,0 a 12,0%. O resultado foi publicado em junho do ano passado em artigo científico na Revista Brasileira de Agropecuária Sustentável (UFV-MG).

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“O número de grãos por espiga não se diferenciou entre as cultivares, mas o peso de mil grãos variou significativamente, com destaque para a cv. BRS Kalibre, com média de 59,3 g, contra 55,6 g e 51,8 g das cultivares BRS Brau e BRS Sampa, respectivamente. Os níveis de produtividade surpreenderam em relação a outras regiões, com médias de 4.870, 4.977 e 5.593 kg ha-1 para as cultivares BRS Sampa, BRS Brau e BRS Kalibre ”, explica.

Após a fase experimental, em 2019 o pesquisador abriu para a unidade para visitação e distribuiu sementes aos agricultores da região.

Outra iniciativa nas montanhas

O professor universitário aposentado Eduardo Batitucci foi um dos proprietários rurais das montanhas do Espírito Santo a adquirir e plantar sementes da cevada BRS Kalibre. Juntamente com o professor e doutor em Ciências de Alimentos Rodrigo Scherer e o empresário Herman Pinel, ele se diz satisfeito com os resultados no Sítio Dei Fiori, em São José do Alto Viçosa, zona rural de Venda Nova do Imigrante.

A expectativa do trio é superar o período de expansão do Coronavírus para maltear os grãos de cevada e produzir uma cerveja com a mesma proposta da Nativa. “O Herman fez curso de malteação em Blumenau [SC] e o Jacimar [Incaper] nos dará apoio neste processo ”, conta Batitucci.

Scherer defende mais áreas experimentais com cevada nas montanhas capixabas para propagar sementes e garantir volume maior de produção a médio prazo. Para o professor, um empecilho para o Estado ser um grande produtor da gramínea é o relevo acidentado da região, que dificulta a colheita mais mecanizada.

“Ainda é muito recente especular mercado. É necessário levantar recursos de pesquisa junto aos institutos estaduais e federais, a exemplo do Incaper e do Ifes, para ampliar as áreas experimentais. O Estado importa quarenta toneladas de malte todo ano, atender esta demanda não será tão simples ”, avalia Scherer.

&Aacute,rea cultivada com cevada cervejeira em Venda Nova do Imigrante.

 

‘Tempero’ também capixaba

O lúpulo é considerado o tempero da cerveja na fase do cozimento da bebida. Mesmo não sendo objeto de estudo na unidade Centro-Serrana do Incaper, foi criada uma área demonstrativa com 20 plantas da variedade Cascade em parceria com a Secretaria de Estado da Agricultura (Seag) e Associação dos Cervejeiros Artesanais do Espírito Santo (Acerva-ES).

O pesquisador Jacimar Souza compartilha os resultados semanalmente pelas redes sociais. Um deles é o tutoramento baixo no experimento. O objetivo do estudo é resolver a desuniformidade de amadurecimento dos clones com colheita escalonada.

Os ramos do experimento são conduzidos em fios de forma semelhante aos parrerais de maracujá. Em fevereiro, foram realizadas as três primeiras colheitas, fornecendo matéria-prima inclusive para o preparo da cerveja “H&uuml,gel Bier Nativa ”.

“A cultivar Cascade tem produzido bem. Ainda vamos entrar na fase de analisar o óleo essencial deste lúpulo. A partir do ano que vem, as plantas vão produzir mais porque já estarão adultas ”, avalia Jacimar.

O Sítio Dei Fiori (Venda Nova do Imigrante) também terá a primeira colheita de lúpulo prevista entre agosto e setembro. “Testamos a variedade Kolumbus, vinda de Gramado [RS], mas a resposta não foi tão boa quanto o Carquejo, com melhor reprodução ”, diz Eduardo Batitucci.

Plantio com mudas certificadas e parceria regional

As iniciativas com lúpulos no campo experimental não são as únicas nas montanhas capixabas. Há pelo menos 20 produtores investindo em outras variedades, diferentes em amargor e sabor, segundo o Incaper. Os cultivos maiores chegam a ter 400 plantas.

Em Paraju (Domingos Martins), o casal Rovena B&uuml,ge e Eduardo Craveiro de Sá, em sociedade com o pai dela, Romildo B&uuml,ge, iniciou há cerca de seis meses cultivos de lúpulo das variedades Cascade, Saaz e Centennial em uma área de 1.000m&sup2,. As plantas são todas oriundas de mudas de viveiro certificado pelo Ministério da Agricultura.

A primeira colheita está prevista para abril. Os produtores já deram entrada na documentação necessária para iniciar a comercialização da flor de extrema importância para a fabricação da cerveja.

 

E a família já tem parcerias em andamento. Uma delas é com a cervejaria Barba Ruiva (Domingos Martins) para a produção de dois rótulos de cerveja artesanal usando lúpulo in natura. “Estamos ansiosos para ver o que vai dar ”, diz Rovena.

De acordo com o proprietário da cervejaria, o empresário Daniel Buaiz, as cervejas serão uma Pilsen lupulada, com o amargor tradicional, típico da cidade de Pilsen (República Tcheca), e uma Double Ipa.

“O lúpulo vai ser colhido pela manhã e usado bem fresco durante a fervura na parte da tarde, no mesmo dia. É algo inédito no Estado, vai ser bem legal ”, diz Buaiz.

O empresário destaca a seriedade do trabalho daHopfenb&uuml,ge Lúpulos. “As matrizes têm certificado de que são a espécie que os produtores dizem estar plantando. É um trabalho muito sério, respaldado por um agrônomo ”. (*Saiba abaixo sobre uma conquista recente da cervejaria Barba Ruiva!)

Parceria: Daniel Buaiz (D) com o casal Rovena e Eduardo.

 

Rede

Rovena, o marido e o pai também mantêm contato constante com um grupo local de produtores de lúpulo. O objetivo é trocar informações que ajudem “todos a crescerem juntos ”.

“Estamos iniciando um setor ainda inexistente no país. Tem outros interessados em começar a plantar lúpulo que vamos assessorar na parte técnica. E por que não tornar o Estado, além de polo cervejeiro, um polo produtor de lúpulo no país? É algo muito promissor, uma boa ideia para quem não sabe como usar a terra ”, analisa Rovena B&uuml,ge.

Além da rede em formação, o trio de Paraju é parceiro de estudo científico pioneiro realizado pelo Ifes campus Vila Velha. Os agricultores vão ceder amostras da planta para atestar a sua qualidade. Segundo Rovena, em uma próxima etapa a pesquisa vai analisar os óleos essenciais do lúpulo.

Cerveja capixaba é premiada

Durante o Concurso Brasileiro de Cervejas, entre os dias 7 e 9 de março, em Blumenau (SC), a Cervejaria Barba Ruiva, de Domingos Martins, conquistou a medalha de ouro de Melhor Cerveja Defumada do Brasil. Trata-se da Rauchbock, já detentora do título de melhor defumada do mundo (World Beer Awards), concurso realizado em agosto passado.

Segundo o proprietário, Daniel Buaiz, a Rauchbock é uma cerveja no estilo da cidade de Bamberg, na região da Baviera (Alemanha), onde só se fabricam cervejas defumadas. A bebida tem 7,5% de álcool e feita com malte defumado e notas defumadas de bacon, que equilibram com o dulçor dos maltes especiais.

“É uma honra muito grande para a gente ter o reconhecimento da qualidade dos nossos produtos em concursos nacionais e internacionais ”, declara Buaiz.

Considerado o maior concurso da América Latina e o terceiro maior do mundo, o Festival Brasileiro de Cervejas premiou 203 cervejas de 126 marcas nacionais.

Ao todo, concorreram 3.246 amostras e 203 medalhas foram entregues. Das 634 cervejarias, somente 126 receberam alguma medalha. A Barba Ruiva foi a única capixaba a conquistar medalha de ouro no concurso.

O evento é uma realização da Associação Blumenauense de Turismo, Cultura e Eventos (Ablutec) com a coordenação técnica da Escola Superior de Cerveja e Malte.

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