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Agricultura familiar

Família garante alta produtividade de leite com silagem de cana e milho

Apesar do clima semiárido, os “Marrinha”, como são conhecidos Antônio de Oliveira e os três filhos, dão exemplo de superação em Montanha, no extremo norte capixaba

por Redação Conexão Safra

em 21/06/2017 às 0h00

9 min de leitura

Família garante alta produtividade de leite com silagem de cana e milho

Há 57 anos, o jovem Antônio Sampaio de Oliveira, então com 16, e sua família subiram em um pau de arara, em Jacobina (BA), para recomeçar a vida em Montanha, no extremo norte capixaba. Era o ano de 1959, uma década após o início da colonização do território por madeireiros baianos interessados em explorar as matas virgens da região às margens do Córrego Montanha à procura de madeira para o comércio.


Após estabelecido, Antônio não demorou para repetir a saga de muitos
nordestinos: tentar novas oportunidades de trabalho em São Paulo. Foi um período curto, mas o pai precisou do seu apoio na roça e o jovem acabou retornando para Montanha. E o baiano já não era o mesmo, pois o visual estava transformado, marcado pelo terno e os imensos óculos escuros. Por ser algo atípico para os rapazes da cidade, logo Antônio ganhou o apelido “Marrinha ”, em alusão à fama de marrento do regresso.


E foi na marra que Seu Antônio, hoje com 73, e os três filhos, Alex (40), Odirlei, o “Lelei ” (39), e Renato (32) viraram referência na bovinocultura leiteira. Proprietários de uma fazenda a 22 quilômetros da sede de Montanha, no distrito de Vinhático, os populares “Marrinha ” fizeram o caminho contrário de muitos pecuaristas da região. Enquanto a maioria investe em modernos currais, a família se dedica à produção de silagem a partir de plantios de milho e cana-de-açúcar na mesma fazenda. O resultado é leite com alta produtividade- média de 2.500 litros por dia-impensável para propriedades de pequeno porte e clima e geografia da região.


Na área total de 100 hectares (ha), 2,2 ha são dedicados à cana e outros 6 ha, ao milho. Segundo os pecuaristas, em breve essa área será ampliada. As plantações de cana passarão a ocupar quase 5 hectares da fazenda e a cana terá mais 3 ha. Os cultivos mudam a paisagem típica, que é plana, semiárida e repleta de pastos. “Nós temos gado na seca e comida no cocho. Mesmo antes de melhorar a ordenha, já nos preocupávamos com a alimentação do rebanho ”, destaca Alex.


Tecnologia


Alex e os irmãos chegaram a desistir da atividade rural há mais de 20 anos, quando venderam todo o gado que tinham. Eles contam que o pai os incentivou a saírem para estudar e todos três passaram pela escola agrotécnica. Ao retornarem para Vinhático, em 2006, resolveram plantar mamão como única alternativa de renda da família.


Anos depois, o trio ensaiou um retorno à pecuária leiteira, com a aquisição de 30 vacas, mas as primeiras experiências não resultaram na produtividade pretendida. Alimentando os animais apenas com ração- a dieta consistia em 1 kg de concentrado (mineral + ração) por dia, durante um mês- as vacas deram entre 10 e 12 kg de leite.


Foi a deixa para os irmãos Marrinha colocarem em prática o conhecimento adquirido em sala de aula iniciando a produção de silagem, a ordenha mecanizada e abrindo as porteiras para a assistência técnica- essa a partir de projetos do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas- Sebrae/ES. Atualmente, o plantel dos “Marrinha ” soma mais de 300 cabeças entre bezerras e vacas em lactação, totalizando 113 animais, e 150 novilhas para reposição e comércio. A produtividade média em apenas um lote já beirou os 32 kg de leite e, atualmente, fica entre 16 kg e 20,5 kg. Entre as recordistas, uma vaca produziu 42 kg em um único dia.


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“Às vezes, o produtor quer dar um concentrado hoje e ter resultado amanhã. No nosso entendimento, vimos que o mais importante para o animal produzir é alimento. Nossa estrutura é simples, mas a comida está garantida para o rebanho. A alimentação correta influenciou até na precocidade da idade reprodutiva das vacas ”, avalia Lelei.


Para manter animais de qualidade no rebanho e a alta produtividade, há dez anos a fazenda atua com fertilização in vitro. O caçula Renato destaca que os resultados dos investimentos perduram. “Nós optamos em ficar juntos, trabalhando no que a gente gosta, e os resultados tendem a prosseguir. Só se progride com investimentos em tecnologia ”, destaca.


No início, a vizinhança chegou a duvidar dos resultados. “É muito difícil encontrar uma propriedade do tamanho da nossa e com os números que já alcançamos dentro da situação econômica e climática que vivemos hoje ”, completa Alex.


E para driblar a estiagem prolongada, que acarretou em uma das piores crises hídricas do Estado, os “Marrinha ” se prepararam com investimentos em duas barragens, ambas licenciadas e fiscalizadas, e em um poço artesiano. O Rio Vinhático é outra fonte de água para manter os plantios de milho e cana irrigados.


Parceria


Desde quando o patriarca Antônio Oliveira ainda estava à frente dos negócios da família, um personagem sempre esteve presente na vida dos “Marrinha ”, a empresa laticínios Damare, fundada há 40 anos em Montanha. Segundo os irmãos Alex, Lelei e Renato, a parceria é uma via de mão dupla: os pecuaristas cumprem com a qualidade exigida e a Damare dá o suporte necessário para produzirem.


Os laticínios funcionam na zona rural do município. Com tecnologia de ponta, a Damare garante lugar entre as maiores e mais modernas fábricas do Brasil no segmento de lácteos. Atualmente, a empresa mantém parceria com mais de 1.000 produtores de leite em todo o Espírito Santo.


Segundo o diretor da Damare, Cláudio Rezende, mais recentemente a empresa investiu em plantios de milho na área de extensão dos laticínios e a meta para os próximos três anos é produzir alimento para 5.000 vacas. “O objetivo dessa área agrícola vinculada aos laticínios é produzir 30 mil toneladas de silagem de milho e cana por ano para ofertar aos nossos produtores ”, afirmou Cláudio.


Os projetos pilotos ocorrem em Montanha e no município vizinho de Pinheiros, mas de acordo com o diretor da Damare, a ideia é levá-lo para outras localidades. “Nós entendemos que a deficiência da região é garantir comida para o gado. Não existe produção de leite sem comida, pois ela está associada a uma alimentação de qualidade para o rebanho. A Damare quer, junto com outros produtores, aumentar a produção de leite e a rentabilidade das famílias no extremo norte do Estado, gerando emprego no campo ”, completou o diretor dos laticínios.


Seu Antônio “Marrinha ” se emociona quando lembra da vinda da Damare para Montanha, em 1976, e da amizade estabelecida com o pai de Cláudio. “O primeiro leite da Damare saiu aqui de casa ”, lembra. E a receita de sucesso desse baiano arretado de coração capixaba é simples: “Hoje as coisas são difíceis para quem é mole. Tem que arregaçar os braços e partir para cima que de qualquer jeito dá certo. Não vejo meus filhos reclamando. De vez em quando ouço: ‘Pai, por que o senhor é tão animado assim?’ Porque eu acredito em vocês, rapazes! ”


‘Ostentação é garantir alimento’, diz veterinário


A tão popularizada palavra “ostentação ” pode ser aplicada na pecuária leiteira da região de Montanha, extremo norte do Espírito Santo. E quem explica é o veterinário Gabriel Terci, coordenador de coleta, transporte e logística e também responsável pela qualidade e assistência aos produtores ligados à Damare. “O tamanho dos currais era uma forma de mostrar dinheiro, quantidade, poder… Hoje, a ostentação está na alimentação e no melhoramento genético do gado ”, avalia Terci.


O veterinário destaca a necessidade de implantar tecnologias dentro do curral para alavancar a atividade, a exemplo da família Oliveira “Marrinha ”. “O norte capixaba tem tradição na cultura extrativista, poucos têm a mesma iniciativa dos Marrinha. Muitas propriedades se especializaram na parte genética, mas se esqueceram da nutrição animal ”, destaca.


Segundo Gabriel Terci, o volumoso, que corresponde à alimentação com silagem e pastagem, corresponde de 60 a 70% da dieta animal e está ligado diretamente à produtividade de leite. “Muitos produtores não se planejam na produção dessa mistura. O concentrado é uma complementação à dieta, porém sozinho

não vai gerar produtividade. ”


Capim melhorado


A crise hídrica atual e o clima seco da região também são desafio para manter pastagens durante todo o ano. Para incentivar os produtores na melhora da nutrição animal, a Damare firmou parceria com empresas agrícolas no fornecimento de sementes de capim Napier, variedade de capim elefante melhorado, bastante adaptado ao clima, pois carece de pouca água.


Fezes do animal podem indicar erros na silagem


Há três anos passando por períodos longos de estiagem, os produtores rurais &ndash, especialmente os de leite

&ndash, estão preocupados em produzir alimento volumoso de boa qualidade para o rebanho. A utilização de silagem de milho e sorgo vem crescendo, mas para que a produção de leite aumente, esse alimento precisa ser planejado com muitos cuidados.


Todas as informações sobre a escolha correta da planta, da produção, do manejo e da estocagem da silagem foram apresentadas pelo médico veterinário e consultor em nutrição de ruminantes Luís Eduardo Zampar durante a 5&ordf, Semana Tecnológica do Agronegócio Coopeavi, em Santa Teresa.


O especialista afirmou que as fezes dos animais e os números da produção de leite podem indicar se a silagem é de boa qualidade ou não. Por exemplo, quando há milho nas fezes da vaca significa que a digestabilidade não está boa.


“Um saco de milho hoje está em entre R$ 40 e R$ 60 e o grão é um dos principais ingredientes da alimentação da vaca. Não podemos permitir que ele não seja aproveitado na
digestão! Faço consultoria em muitas propriedades para descobrir o porquê da queda na produção de leite e vejo que o problema está na nutrição e normalmente na qualidade da silagem ”, disse Zampar.


O especialista explica que numa produção de leite, cerca de 60% dos custos são para alimentação, entretanto se a silagem de milho for de alta qualidade, a produção aumenta, há melhora no escore corporal, e, no caso do gado de corte, o aumento de ganho de peso e o acabamento da carcaça ficam em níveis comerciais satisfatórios.


“O maior desafio da pecuária leiteira é o custo de produção. Os produtores estão pressionados por causa do alto custo, aí entra outro problema: muitos pecuaristas perdem a silagem por erro de armazenamento ou antecipação na colheita do milho ”, afirma Zampar.


Na palestra, o consultor explicou que a silagem precisa ser muito bem compactada para não ter oxigênio no alimento, o que causa um apodrecimento. Outro erro é colher o milho antecipadamente. Segundo ele, o grão leitoso não é bom, é necessário que esteja maduro. “Saibam escolher o tipo do milho. O grão duro não é bom para a silagem, é difícil de ser triturado pelas máquinas e pelos animais. ”

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