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Cafeicultura

Do grão à sustentabilidade: a evolução da cafeicultura capixaba

O Espírito Santo lidera a transição para um café mais sustentável, impulsionado por exigências do mercado global e investimentos em práticas ambientalmente corretas

por Denys Lobo

em 11/10/2024 às 5h00

20 min de leitura

Do grão à sustentabilidade: a evolução da cafeicultura capixaba

Foto: divulgação

Enraizada na história e na cultura do Espírito Santo, a cafeicultura sempre ocupou um papel de destaque na economia capixaba. Iniciada de forma tímida no século XIX, a produção dos grãos logo se fortaleceu, tornando-se a principal atividade agrícola do Estado.
Quase dois séculos depois do início das atividades, o Espírito Santo, que se orgulha em ser o segundo maior produtor do país, vem trabalhando forte, em várias frentes, para se tornar referência para o Brasil quando o assunto é sustentabilidade na produção de café.
Para entender melhor os caminhos percorridos até aqui, a Conexão Safra conversou com produtores, pesquisadores, cooperativas e órgãos governamentais e traz, nesta série especial, a importância dessa mudança e como ela impacta o futuro da cafeicultura do Espírito Santo.

O Início

A busca por um mundo mais sustentável, onde exista preocupação com o meio ambiente e com o uso mais responsável dos recursos naturais, nem sempre esteve entre os principais interesses da sociedade. No entanto, nos últimos anos, após séculos de desmatamento, uso desenfreado de combustíveis fósseis e tantos outros impactos ambientais causados pela ação do homem, o assunto vem ganhando uma importância cada vez maior.

Apesar de ser um movimento em constante evolução e que atualmente conta com três pilares fundamentais bem definidos, a sustentabilidade começou a se fortalecer anos atrás, quando empresas, países mais desenvolvidos e importantes lideranças mundiais começaram a se preocupar com o meio ambiente e a forma como os recursos naturais estavam sendo utilizados.

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“A sustentabilidade usa conceitos de produção que visam sempre à preservação ambiental e que usa informação técnica com o objetivo de oferecer segurança ao trabalhador e a propriedade. É um cultivo feito com uma perspectiva de longevidade, afinal quem cuida do solo, dos mananciais e dos demais recursos naturais pode utilizá-los por muito mais tempo”, explica Tassio Souza, extensionista do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) e coordenador do projeto de Sustentabilidade do Conilon Sul Capixaba.

A mudança de postura dos grandes centros importadores causou reflexos diretos nos países em desenvolvimento e, consequentemente, no Brasil. Dessa forma, para continuar mandando suas matérias-primas para fora do país, produtores precisaram mudar a maneira como produzem seus produtos.
Considerada uma das principais atividades agrícolas do país e a mais importante do Espírito Santo, a cafeicultura também precisou se adequar. As mudanças, como conta o extensionista do Incaper, Fabiano Tristão, começaram no início dos anos 2000, seguindo exatamente esses dois propósitos principais: o de cuidados com o meio ambiente e a exigência dos mercados externos.

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“A produção de café sustentável no Espírito Santo tem início quando produtores de café arábica das regiões do Caparaó e das Montanhas Capixabas começam a buscar mercados diferenciados para seus produtos. A partir daí, eles observam que esses mercados exigiam outros conceitos do café que vão além da xícara. Desde então, essa produção sustentável no Estado vem evoluindo, de forma gradativa e contínua, chegando no conilon em meados de 2010 e alcançando cada vez mais produtores”.

Primeiros passos

A expressão “além da xícara” utilizada por Tristão reflete exatamente a importância do tema sustentabilidade para o mercado atual. Com consumidores cada vez mais exigentes, as empresas vêm dando preferência por comprar cafés que estejam alinhados com esses princípios.
A implantação de lavouras mais resistentes a pragas e doenças; o manejo correto do solo, com nutrição balanceada e equilibrada e um espaçamento preconizado para a produção são alguns dos conceitos mais importantes referentes à sustentabilidade relacionados à parte ambiental. Diferente do que se imagina, até o uso dos defensivos agrícolas, considerado um dos grandes vilões da atualidade, é permitido. Segundo Tassio Souza, o que vai impactar é a forma e a dosagem que esses produtos vão ser utilizados.

“Existe uma grande diferença entre ser sustentável e ser orgânico, onde realmente não há a utilização desses produtos. Ser sustentável é cultivar preservando o meio ambiente e usando esses agroquímicos como última tentativa, em casos de real necessidade. No entanto, o que geralmente acontece, nos casos das pessoas que não aplicam esses conceitos sustentáveis, é que elas utilizam esses produtos sem nenhum tipo de monitoramento”.

Todos esses fatores combinados proporcionam ao produtor um currículo de sustentabilidade, afinal, é possível ter o real conhecimento de todo o processo de produção do café, desde o preparo do solo até a colheita. Além disso, permite ao mercado a possibilidade de realizar a rastreabilidade de toda a cadeia, algo fundamental nos dias atuais.

“O que precisa ficar claro para o produtor é que isso é muito mais uma mudança de postura. Essas boas práticas agrícolas são relativamente simples de serem executadas e não têm um custo intenso. Então, caso ele tenha encerrado uma safra que foi feita sem controle nenhum, com algumas adequações mínimas ele já consegue começar a produzir de forma sustentável”, completa Souza.

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ESG: os três pilares

Tudo que se conhece sobre o tema sustentabilidade atualmente está baseado em um conceito muito importante fundamentado nas palavras Environmental, Social and Governance (ESG), que, traduzidas do inglês, significam Ambiental, Social e Governança.

Criado em 2004, o termo surgiu quando o então secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Kofi Annan, propôs a líderes de grandes empresas mundiais que eles passassem a considerar e inserir esses temas em seus negócios, focando neles junto com o retorno financeiro.

Promover políticas de inclusão e diversidade, regularizar as atividades dentro das propriedades, respeitar leis trabalhistas, pagar um salário justo e cuidar da parte de segurança dos funcionários são alguns dos exemplos da parte social que podem ser seguidos.
Como o próprio nome já diz, na parte de governança são tratados temas ligados diretamente ao negócio, como transparência em toda a gestão, possuir um bom relacionamento com órgãos e entidades governamentais e estruturação da propriedade, por exemplo.

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Com o passar dos anos, as práticas ESG se aprimoraram e chegaram a outros segmentos, inclusive à agricultura. Por isso, para que consigam continuar vendendo seus produtos para os principais mercados do mundo, os produtores entenderam que é preciso ter, além da parte ambiental, os outros dois pilares estruturados.
Segundo o extensionista do Incaper Fabiano Tristão, o fato de os produtores estarem aplicando esses conceitos e terem compreendido a importância dessa mudança para o próprio negócio, são alguns dos motivos para que o café produzido no Espírito Santo continue tendo destaque internacional.

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“Todos esses fatores estão sendo seguidos por produtores capixabas e a principal consequência disso é a melhora na imagem da cafeicultura de toda a região. Isso ajuda a aumentar a lucratividade do agricultor e cria um círculo virtuoso no município, afinal, o dinheiro que ele recebe vai girar dentro da própria cidade, o que ajuda a criar oportunidades de emprego e assim por diante”, comenta.

Mudanças

Além de servir como um diferencial importante, aplicar os conceitos ESG e focar na sustentabilidade trazem uma série de benefícios, tanto para o meio ambiente quanto para o produtor.
Uma pesquisa recente sobre o balanço de Gases do Efeito Estufa (GEE) revelou que a adoção de práticas sustentáveis na produção cafeeira capixaba ajuda a extrair mais de oito toneladas de gás carbônico (CO2) da atmosfera por ano, enquanto na produção tradicional esse número só chega a três toneladas. Os dados foram divulgados pelo Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) em parceria com o Incaper.

“Não é só no meio ambiente que essas vantagens são perceptíveis. Um café especial vai agregar, no mínimo, 30% a mais no valor que o produtor vai receber por esse produto, então é algo vantajoso. Costumo dizer que produzir de forma sustentável não é mais um diferencial, e sim, uma necessidade. É um caminho que o agricultor precisa entrar o quanto antes, pensando, inclusive, no próprio futuro”, completa Tristão.

As exigências dos principais mercados compradores também têm contribuído para o fortalecimento da sustentabilidade. Uma lei sancionada e aprovada pela União Europeia em 2023, denominada Pacto Verde, quer proibir a entrada no bloco de produtos provenientes de áreas que foram desmatadas depois de 2020 – algo que vai impactar diretamente os principais mercados produtores.

Com relação às empresas, os números também falam por si. De acordo com pesquisa divulgada pela Global Coffee Platform (GCP), a quantidade de café sustentável adquirido por oito das principais torrefadoras e varejistas do setor aumentou consideravelmente nos últimos cinco anos, saltando de 35% para quase 74% do valor total.

Em 2018, por exemplo, apenas 10 milhões das quase 30 milhões de sacas compradas por essas empresas eram de cafés sustentáveis. Já em 2022, das 36 milhões de sacas compradas, 26 milhões eram de cafés sustentáveis.
Por essa razão, explica Tassio Souza, a importância de se adequar às questões sustentáveis tem sido cada vez mais urgente. “Costumo dizer que todas essas decisões não são do Espírito Santo ou de algum órgão específico. Elas são exigências internacionais, de um mercado externo que está, cada vez mais, alinhado com essas práticas”.

Espírito Santo

Segundo maior produtor de café do Brasil e primeiro do ranking na produção de conilon, o Espírito Santo entendeu com rapidez que, para continuar mantendo o destaque que possui junto aos mercados externos, era preciso unir a força de todo o segmento para que essas adequações impositivas do mercado referentes à sustentabilidade fossem, de fato, aplicadas.

Com o intuito de auxiliar os produtores e ciente da importância financeira da atividade para a economia do Estado, a Secretaria da Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca (Seag) lançou, em maio de 2023, o Programa de Desenvolvimento Sustentável da Cafeicultura do Espírito Santo.

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“Ele é, seguramente, o mais completo programa de desenvolvimento da cafeicultura do Brasil. O conceito de sustentabilidade é um tema que está incluso em todos os eixos de atuação e o objetivo é agregar valor à produção de café do Espírito Santo”, afirma o secretário de Estado da Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca, Enio Bergoli.

Estruturado nos eixos de governança, sustentabilidade, tecnologia, social e agregação de valor, ele engloba todos os conceitos primordiais do ESG e tem como objetivo principal inserir o Espírito Santo como uma das principais origens de cafés no mundo.

“Sabemos que, em um futuro não muito distante, só vai permanecer no mercado quem tiver um produto com qualidade e que tenha sido produzido seguindo os princípios da sustentabilidade. Nós iniciamos esse programa com 27 projetos e estabelecemos metas para que, em 2030, consigamos ter 35 mil propriedades no Espírito Santo com um currículo mínimo de sustentabilidade, sendo 20 mil de conilon e 15 mil de arábica. Isso significa deixar esses cafeicultores preparados para serem certificados por qualquer empresa”, completa Bergoli.

As falas do secretário estão alinhadas também com o que pensa o vice-governador e secretário de Desenvolvimento do Espírito Santo, Ricardo Ferraço.

“A cafeicultura, bem como outras atividades de excelência, está num caminho sem volta onde o mercado é quem determina o tipo de produto que busca. O Espírito Santo possui destaque internacional na produção de café e isso não é por acaso, afinal todo conhecimento desenvolvido e empregado nas lavouras capixabas é fruto de muito trabalho e dedicação, mas queremos ir além: desenvolver mais e seguir melhorando a qualidade com respeito ambiental. Estamos nos consolidando também como um grande polo de industrialização e processamento de cafés e a conexão rápida entre produtor e indústria é mais um atrativo para o segmento”, diz Ferraço, que também ocupou a pasta estadual de Agricultura, entre os anos de 2003 a 2006.

Mais investimentos

Além do programa, o Espírito Santo vem se destacando no fortalecimento das pesquisas relacionadas à atividade. Em março deste ano, o Governo do Estado realizou o maior aporte de recursos da história voltados para o desenvolvimento sustentável da cafeicultura capixaba, no valor de R$ 8,5 milhões.

Os projetos serão executados em quatro frentes principais e abrangem a implantação do currículo de sustentabilidade em mais de oito mil propriedades, a criação de 92 unidades de referência no tema, o protagonismo das mulheres na cafeicultura, por meio de cursos e oficinas; além de pesquisas para identificação de novas pragas que estão surgindo, como o cancro dos ramos do cafeeiro.

A ideia, segundo o subsecretário de Desenvolvimento Rural da Seag, Michel Tesch, é que tudo que possa contribuir para o desenvolvimento da atividade seja repassado ao produtor, aumentando ainda mais a produtividade das lavouras.
“Pelo tamanho do nosso Estado e da nossa produção, o café é mais importante para nós do que para qualquer outro Estado da federação, então não tem nenhum assunto da cafeicultura mundial que a gente não esteja tratando aqui. Por isso, procuramos auxiliar os produtores em tudo que é possível. Temos trabalhado para conseguir mais produtividade, afinal isso traz um resultado econômico ainda melhor. Temos estimulado os produtores a substituir as lavouras antigas e apostar na renovação com base na tecnologia, com manejo, nutrição e material genético de qualidade. Dessa forma, podemos crescer sem abrir novas áreas”.

Visitas

O trabalho executado em todas essas frentes tem gerado diversos benefícios positivos ao Espírito Santo. E um dos principais é colocar os cafés capixaba na rota das comitivas internacionais dos grandes centros compradores. Desde o ano passado, dirigentes de entidades internacionais e executivos de grandes indústrias de café dos Estados Unidos e da Europa vem pessoalmente ao Estado para conhecer as práticas ESG aplicadas na cafeicultura capixaba.

Durante o período que passam por aqui, o grupo visita propriedades que produzem café conilon, na região Noroeste, e arábica nas regiões Sul, Serrana e Caparaó, além de conhecer cooperativas e centros de pesquisa.
De acordo com a Seag, já estiveram no Estado membros do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, na sigla em inglês), da Associação da Indústria do Café dos Estados Unidos (NCA), da Organização Internacional do Café (OIC) e da Comissão Europeia DG INTPA F3 – Sistemas Alimentares Sustentáveis e Resilientes.

Segundo o secretário de Agricultura, Enio Bergoli, o saldo foi positivo nas duas ocasiões que o encontro foi realizado. E a ideia é que ele se repita ainda este ano. “Receber essas pessoas aqui e percorrer essas propriedades com elas é fundamental para que consigamos mostrar pessoalmente tudo que está sendo feito. Quando eles visitam e gostam do que é apresentado, acabam se tornando porta-vozes do Espírito Santo no exterior e, hoje, nós temos ciência que somos considerados um bom exemplo para as demais regiões cafeicultoras do mundo. Tudo isso gera para nós uma confiabilidade lá fora, junto a essas empresas e mercados compradores, sem precedentes”.

A principal prova que o trabalho feito pelos produtores, as visitas e os investimentos estão dando retorno pode ser observado nos números de exportação do agronegócio capixaba em 2024. As divisas geradas ultrapassaram o valor de R$ 10 bilhões, tornando-se o maior valor já registrado no período de janeiro a julho de um único ano. Desse total, cerca de R$ 5,6 bilhões – mais da metade – são exclusivos do complexo cafeeiro.

No quantitativo comercializado, os números também são satisfatórios. Até o momento, a Seag registrou 4,79 milhões de sacas de café comercializadas, de janeiro a julho – 4,16 milhões de conilon, 329 mil de solúvel e 296 mil de arábica.

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Os números positivos e todo o trabalho que vem sendo executado nas mais diversas frentes servem para que o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, reforce a qualidade do café capixaba e a importância de todo esse desenvolvimento sustentável feito no Estado. Reconhecido nacionalmente como um dos principais articuladores em favor das questões climáticas e de sustentabilidade, ele garante que o Estado seguirá sendo referência no tema.

“O café produzido no Espírito Santo é o melhor do país e isso não é por acaso. Temos realizado muitos investimentos em pesquisa e extensão, qualificando nossos produtores e os cafés têm sido referência para o Brasil e o mundo. O terreno para se produzir café de qualidade é o mesmo, então, o diferencial está na pesquisa, na inovação e agora, na sustentabilidade. O mundo está voltado para a produção sustentável e o Espírito Santo está na vanguarda desse movimento. Inclusive, ficamos muito bem posicionados no eixo sustentabilidade ambiental no Ranking de Competitividade do CLP”, finaliza Casagrande, citando o quarto lugar alcançado pelo Estado no ranking de Competitividade dos Estados, divulgado pelo Centro de Liderança Pública (CLP).

Café de qualidade, sustentável e seguro

Além de cafés premiados e produzidos de forma sustentável, o Espírito Santo vem se destacando também em um tema ainda pouco desenvolvido, mas que deve marcar o futuro da cafeicultura brasileira: a segurança alimentar.
Apesar de ser a bebida mais consumida no país após a água, a maior parte do café vendida no Brasil apresenta índices alarmantes de Ocratoxina A, uma micotoxina causada por fungos e que pode aparecer durante o crescimento, colheita ou estocagem dos produtos.

Encontrada em outros alimentos além do café, como cereais e feijão, ela é prejudicial à saúde dos seres humanos e animais, e seus níveis de contaminação devem ser monitorados de forma constante.

Preocupados com a situação e cientes dos riscos para a população, um grupo de cientistas capixabas, capitaneados pela engenheira biotecnológica Luiza Respi, decidiu se unir para encontrar uma solução viável para reduzir os índices da toxina e que fosse rentável ao mercado – o que, segundo as grandes empresas, eram os grandes gargalos com relação ao tema.

“Esses testes para quantificar a quantidade de Ocratoxina não foram feitos porque a análise é muito cara. Em 2020, nós criamos uma startup que trabalha com nanotecnologia, onde desenvolvemos biossensores que permitem a detecção rápida e confiável dessa toxina durante a seleção dos grãos de café, proporcionando o resultado em tempo real e com baixo custo. No entanto, quando levamos essa solução às empresas, não recebemos o retorno esperado”, relata Luiza, pós doutora em Biotecnologia pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).

Riscos

Amante do café, Luiza detalha que durante as pesquisas o grupo percebeu que 80% das amostras analisadas estavam contaminadas pela Ocratoxina A e 98% por glifosato, principal herbicida utilizado nas lavouras e que pode ser prejudicial à saúde humana, em níveis elevados.

Além das questões de saúde, a preocupação com relação a quantidade dessas toxinas no café se deve aos limites exigidos pelos órgãos fiscalizadores e, consequentemente, a importância para o Brasil da exportação de uma de suas principais matérias-primas.

De acordo com uma Resolução da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), de fevereiro de 2011, os limites máximos tolerados (LMT) para Ocratoxina A no café (sejam eles em grãos, moído ou solúvel) é de 10 microgramas (µg) por quilo. No entanto, segundo Luiza, em diversas análises feitas pelo grupo, foram constatadas incidências de 15 até 25 microgramas por quilo.

Como parâmetro, o limite permitido na Europa, um dos principais mercados importadores do café brasileiro, é de apenas três microgramas por quilo, uma diferença considerável e que pode afetar as vendas dos produtos para esses mercados no futuro.

Apesar dos riscos, a fiscalização branda dos órgãos reguladores e a falta de consciência da população, que desconhece os efeitos causados por essas toxinas, foram apontados pela cientista como os principais fatores para que as empresas não se preocupem tanto com esses problemas.

“Diversos estudos científicos já revelaram que o glifosato pode levar ao câncer de mama, a infertilidade e a danos na regulação hormonal, além de toxicidade na tireoide. Já a ocratoxina pode gerar diversos malefícios por se acumular no organismo. Ela é considerada um agente cancerígeno, que pode causar toxicidade nos rins e diminuição da imunidade”, revela.

A invenção

Com a tecnologia testada e após resultados comprovados, os cientistas lançaram há quatro meses a Trius Coffee. A marca é a primeira do Brasil que realiza uma triagem rigorosa com relação a Ocratoxina A e o glifosato em cada saca de café e que garante a ausência dessas substâncias em seu produto.

“O nome Trius surgiu da palavra triagem com a terminologia ‘ius’, que em latim significa justo. Nosso propósito, desde o início, era colocar no mercado um produto diferenciado e de alta qualidade, que priorizasse a segurança alimentar em todas as etapas de produção e fosse confiável e seguro para os nossos consumidores”, conta a cientista Luiza Respi, que se tornou diretora-geral da empresa.

O café, que foi apresentado ao público no evento Sustentabilidade Brasil, realizado na Serra, no fim de junho, é produzido em pequenos lotes e vendido diretamente no site da Trius Coffee. Todo o processo de produção, desde o cultivo até a embalagem, é feito de forma sustentável, alinhadas aos princípios ESG.

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Para garantir o nível de exigência a que se propõe, Luiza relata que os testes e a triagem são feitos de forma rigorosa, coletando amostras das partes de cima, do meio e do fim da saca utilizada para produção. Além disso, todo o café escolhido para ser utilizado no primeiro lote veio da fazenda de Theodoro Stein, agricultor do distrito de Vila Pontões, em Afonso Cláudio, reconhecido pela produção focada na qualidade.

“O Theodoro e sua família são conhecidos pelo trabalho de excelência que realizam na propriedade. É um produtor que já trabalha há anos com prática regenerativa e não utiliza glifosato, fatores que são fundamentais para nós. Mas a nossa ideia, à medida que formos ganhando mercado, é ampliar o número de produtores que trabalhamos em conjunto”.

Com os conceitos da sustentabilidade cada vez mais em evidência e com o segundo lote do café já sendo comercializado, a cientista reforça a importância dessas mudanças e faz planos para o futuro – dela, da marca e do planeta.

“Eu tenho total certeza que o nosso mundo está se degradando, junto com nossos recursos naturais. Tudo isso impacta diretamente na nossa sociedade e é através da sustentabilidade que vamos conseguir promover uma melhora do mundo e dos seres humanos. Produzir de forma sustentável e consumir produtos que ofereçam segurança alimentar é qualidade de vida e questão de saúde pública, afinal a gente é o que a gente come”, finaliza.

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