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Um case chamado Caparaó

Produtores locais protagonizam movimento pela garantia da identidade dos cafés da região

As lavouras de Arábica em Irupi têm a Serra do Caparaó como pano de fundo.(*Fotos: Leandro Fidelis)

Matéria publicada originalmente 01/08/2019

Além da agregação direta de valor, a produção de cafés especiais possibilita o crescimento do turismo, como é o caso do Caparaó, região do entorno do Pico da Bandeira, a terceira montanha mais alta do Brasil. Nos últimos anos, um crescente número de propriedades passou a receber a visita de especialistas do mundo inteiro por conta das particularidades dos grãos produzidos acima de 1.000m de altitude.

De acordo com o agrônomo João Pavesi, a descoberta da zona cafeeira situada entre Espírito Santo e Minas Gerais ocorreu em 2013 com o Prêmio Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café). O excelente resultado chamou atenção do governo capixaba e de cafeterias do país e do exterior.

“Os cafeicultores começaram a participar mais intensamente de episódios com provadores do mundo inteiro, e as cafeterias da Europa, Ásia e Oceania descobriram nossa existência ”, diz.

A visibilidade para o lado capixaba do Caparaó, ainda que no contexto da produção de nano e microlotes de especiais, vem ganhando corpo, com os valores sendo proporcionais à melhoria de aspectos sensoriais e de pontuação. Cafés que são verdadeiros artigos de luxo. Uma saca pode alcançar R$ 3 mil sem ser submetida a concurso ou leilão.

Um segundo momento da entrada do Caparaó na rota dos cafés gourmet foi incentivado por concursos municipais e regionais. Os produtores começaram a melhorar ainda mais os processos e a buscar capacitação. A partir de 2012, os campi do Ifes Alegre e Venda Nova estimularam os produtores a provarem os próprios cafés, e o mercado interno passou a adquirir mais grãos especiais capixabas.

“Produtores que há 15 anos não achavam ser possível fazer café especial começaram a desacoplar das cotações de cafés comerciais commodities ”, pontua o agrônomo.

Colheita do catuaí amarelo em Forquilha do Rio, Distrito de Pedra Menina (Dores do Rio Preto)

A vocação do Caparaó para os cafés finos ficou ainda mais visível nas últimas edições da Semana Internacional do Café. A conquista do primeiro e do segundo lugar da categoria Arábica em 2018foi a mais recente. A família de José Alexandre Lacerda, de Forquilha do Rio, no distrito de Pedra Menina (Dores do Rio Preto), cravou o seu nome dentre os principais produtores de cafés especiais do Brasil.

“Hoje, na crise que vive a cafeicultura com preços baixos e altos custos de produção, com certeza investir em especiais vale muito a pena. No especial, conseguimos ter margem de lucro bem melhor e participação até a xícara do café, o que é gratificante para o produtor ”, afirma Lacerda.

Os grãos do Caparaó mostram superioridade também em outros segmentos de concursos de qualidade. É o caso da competição promovida pela Associação Brasileira de Cafés Especiais (BSCA, sigla em inglês) entre cafés de colheita tardia. Em 2018, dos 20 melhores cafés brasileiros, 15 eram da região.

A façanha se repetiu este ano com a segunda edição. Dos 22 finalistas, 15 também eram provenientes do entorno do Pico da Bandeira.

“Isto está consolidando a imagem do Espírito Santo, assim como a do lado mineiro. São cafés de butique, acima de 88 pontos ”, destaca Pavesi.

João Pavesi (no destaque) dedica-se a pesquisas na área de cafeicultura. (*Divulgação)

Numa perspectiva otimista, o especialista considera possível que, na próxima década, das atuais 2,46 milhões de sacas produzidas no Caparaó, 10% do volume total seja de cafés especiais. A meta se baseia na adesão de novos produtores a este tipo de produção.

“Temos meta de 246 mil sacas de especiais com ágio de pelo menos R$ 200 por saca. Isto injetaria R$ 50 milhões por ano na mão de pequenos produtores da região ”.

A garantia da identidade para os Cafés do Caparaó está na construção e no reconhecimento da Indicação Geográfica, protagonizada desde o princípio pelos cafeicultores locais. Nos últimos quase cinco anos, um grupo de especialistas e produtores dedicou-se à avaliação dos municípios e à documentação histórica, cultural e social da cafeicultura na região para a obtenção do selo de Denominação de Origem.

A candidatura ao registro reconhecido internacionalmente foi depositada neste ano no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). O projeto conta com suporte do Sebrae e dos principais parceiros da cadeia da cafeicultura do Estado. O apoio do Sebrae estende-se ainda para as IGs das Montanhas do Espírito Santo e do Conilon Capixaba.

“Se o governo não encampar essa divulgação, vai dificultar muito à região colocar café com valor agregado que valha a pena o investimento dos produtores. O marketing tem que ser feito de forma geral para nos livrar da pecha de produtor de cafés ruins. A tendência de aumentar a oferta de cafés especiais se dá de forma parceira, com os elos da cadeia confiando uns nos outros. Ainda está muito tímida a participação do governo do Estado ”, avalia João Batista Pavesi Simão.

*Com a colaboração de Uilson de Castro Souza e Cristiano Faria de Castro.

Sobre o autor Leandro Fidelis Formado em Comunicação Social desde 2004, Leandro Fidelis é um jornalista com forte especialização no agronegócio, no cooperativismo e na cobertura aprofundada do interior capixaba. Sua trajetória é marcada pela excelência e reconhecimento, acumulando mais de 25 prêmios de jornalismo, incluindo a conquista inédita do IFAJ Star Prize 2025 para um jornalista agro brasileiro. Com experiência versátil, ele construiu sua carreira atuando em diferentes plataformas, como redações tradicionais, rádio, além de desempenhar funções estratégicas em assessoria de imprensa e projetos de comunicação pública e institucional. Ver mais conteúdos