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Bons negócios com bambu

Mosteiro Zen-Budista de Ibiraçu incentiva cultivo da variedade Guadua como alternativa de diversificação

por Leandro Fidelis

em 09/11/2023 às 0h00

8 min de leitura

Bons negócios com bambu

*Foto: Leandro Fidelis/*Imagem com direito autoral. Proibida reprodução sem autorização

*Matéria publicada originalmente em 22/08/2017

O Espírito Santo dá os primeiros passos para cultivar bambu Guadua no norte do Estado. As primeiras 300 mudas foram adquiridas pelo Mosteiro Zen Budista Morro da Vargem, de Ibiraçu, e estãosendo distribuídas entre os agricultores do município.

De origem amazônica, a variedade da gramínea vem sendo amplamente usada na construção civil em países como a Colômbia. Além disso, uma iniciativa conjunta entre poder público, empresariadoe a direção do mosteiro promete transformá-la em alternativa de renda e diversificação nas propriedades rurais nos próximos anos.

A ideia surgiu depois da participação do monge Daiju Bitti, abade do mosteiro, em um treinamento no Japão, onde a cultura do bambu é muito presente. Ele conta que os planos de fomentar ocultivo ganharam força após uma missão técnica em maio deste ano, na Colômbia, com a participação dele, do prefeito de Ibiraçu, Eduardo Marozzi Zanotti, e do vereador Weverton FerreiraTonon.

A convite da Universidade de Quindío, o grupo conheceu pesquisas na área tecnológica com destaque para o bambu Guadua na fabricação de supercondutores em substituição às baterias decelulares, além de obras públicas. A viagem incluiu também pequenas indústrias e laboratórios que testam a resistência do bambu na arquitetura e na engenharia.

“Na Colômbia vimos pontes, catedrais, escolas, pedágios e até edifícios com cinco andares feitos com o material. É o país onde o uso do bambu é mais avançado na construção civil, enquanto o Brasil carece de estudos e legislações adequadas ”, diz Daiju.

Numa comparação otimista para os capixabas, a Colômbia é o terceiro maior produtor mundial de café e a região onde tem bambu é a mesma das lavouras cafeeiras, a conhecida Zona Cafetera. “Lá, bambu e café estão misturados. O Espírito Santo é grande produtor de café como os colombianos, por isso podemos fazer a conjugação entre café e bambu sem nenhum conflito. ”

 

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MAIS PRODUTIVIDADE

O bambu é uma cultura de rápido crescimento, permitindo obter a primeira colheita já no quinto ano, além de ser uma produção agrícola de baixo custo. Diferentemente das variedades maiscomuns no Estado, o Gadua não cresce em touceiras, possui cultivos mais isolados, que permitem trânsito entre os pés, cortes seletivos e produção maior por hectare.

“Não precisa de muito espaço na propriedade para plantar. Trata-se de uma variedade considerad a econômica, tem volume de massa maior que o eucalipto, com crescimento mais rápido, em cincoanos já dá para corte. E é uma cultura perene, não precisa de replantio. Além disso, a celulose do bambu vai ocupar um importante espaço no futuro ”, destaca.

A viabilidade do bambu enquanto alternativa econômica depende de um conjunto de fatores, avalia o coordenador de projetos da Gerência de Agroecologia e Produção Vegetal da Secretaria de Estado da Agricultura (Seag), Pedro Carvalho. Entretanto, é oportuno destacar que a viabilidade na produção não necessariamente significa a constituição de um mercado. “Questões como concentração de oferta, infraestrutura logística, existência de unidades de beneficiamento e, sobretudo, de demanda são variáveis que precisam ser equacionadas para atestar a viabilidade econômica da atividade ”, diz.

Para Carvalho, é necessário analisar a atividade numa perspectiva sistêmica, desde seu início na propriedade rural, passando por todas as atividades desenvolvidas até se chegar ao produtoacabado adquirido pelo consumidor final. “Cabe destacar ainda que toda a diversificação das propriedades rurais é bem-vinda, se entendermos que estamos vivendo um momento de transiçãoglobal de mercados, culturas, mitos e verdades e por fim, tendências. Não adianta se pensar num caminho mercadológico se não houver o risco de se reinventar e acreditar no novo. No caso dobambu não é diferente. Desde uma pegada ambiental até econômica, tudo é possível, desde que haja produção, empreendedorismo e visão sistêmica de futuro ”, conclui o pesquisador.

Ainda segundo Carvalho, a constituição de um mercado novo depende de um processo de intervenção na oferta e na demanda. “Pelo lado da oferta, é necessário estimular a produção em escalacomercial, a qual garanta volume e regularidade para oferta local. Pelo lado da demanda, é necessário mudar hábitos e levar os consumidores capixabas, tanto empresas quanto famílias acriarem o hábito de consumir e utilizar o bambu. ”

 

MUDANÇA DE PARADIGMA

A difusão do uso mais qualificado do bambu, começando pelas propriedades rurais, é um dos desafios da iniciativa em Ibiraçu. “Para nós, o bambu tem o uso muito rudimentar. Quando pensamos nele, é num chiqueirinho ou galinheiro provisórios ou fazer estacas para escorar plantios de tomate, chuchu e maracujá, nunca focamos seu uso permanente. Antes de começarmos a produção,precisamos primeiramente quebrar essa mentalidade que bambu é gambiarra e dar nova dimensão à sua utilização ”, avalia o monge Daiju.

A dica do monge é promover pequenas mudanças na rotina do produtor, principalmente na hora de criar estruturas para a produção agrícola. “Se o produtor vai fazer um galpão para encaixotartomate, já pensa logo em cortar eucalipto para fazer a estrutura. A ideia é ter um novo elemento como opção, que é o bambu, que estará ali, na sua área. Uma moita de bambu em qualquerpropriedade enfeita, é bonita. E a variedade Guadua é mais convidativa, não repele. ”

A busca por informações para sustentar o projeto no Estado continua neste ano. Em outubro, está prevista uma excursão para a sede do Instituto Jatobás, onde foram adquiridas as mudas. Acomitiva contará com os prefeitos de Ibiraçu, Montanha, Mucurici e Ponto Belo.

De acordo com o monge, a Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) concentra plantios pioneiros do Guada no Brasil e mantém viveiros e um depósito que distribui bitolas devários tipos de bambu para utilização em projetos arquitetônicos. A própria sede do instituto foi construída com o material.

“O grupo pretende analisar a aplicação do bambu e a parte comercial do negócio. Trata-se de um projeto de médio e longo prazo. A madeira é um bem escasso e o eucalipto encontra problemasdependendo do tipo de solo. Por sua vez, o bambu funciona como proteção das encostas dos rios, um problema sério em terras capixabas, pois não temos matas ciliares. O bambu vai ocupar umespaço importante nas construções nos próximos vinte ou trinta anos, em substituição ao ferro e à madeira. Nós queremos estar na vanguarda disso ”, avalia Daiju Bitti.

Além das missões técnicas, a ideia é organizar seminários e grupos de estudos para envolver empresários, arquitetos, engenheiros e produtores rurais capixabas na iniciativa. “O período é dejuntar o máximo de informações para não parar com essa febre. Temos que colocar a coisa para fermentar naturalmente, não vamos trazer ilusões. O agricultor já vive muito sacrificado e estácansado de se iludir com tantas ondas de diversificação com promessa de renda. Não queremos passar por isso, o bambu depende do campo e sua implantação tem que seguir passo a passo. ”

 

ÂNIMO

O empresário e produtor rural Marcos Antônio Baptista, dono de uma serraria e marcenaria em Ibiraçu, aposta no desenvolvimento regional com a cultura do bambu. “Meu interesse em relação aoprojeto é mais uma alternativa de trabalho e fonte de renda. O bambu é matéria-prima para a fabricação de móveis e construção civil, mas também é opção para a própria edificação rural. Agente percebe a dificuldade dos produtores para construir galpões e outros similares com o longo tempo para colher eucalipto e o custo para tratá-lo. A cultura do bambu vem pararevolucionar essa realidade ”, afirma Baptista.

O secretário Municipal de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Meio Ambiente de Ibiraçu, Paulo Roberto Da Rós, promete acompanhar os resultados. “A iniciativa despertou muita curiosidadeentre os produtores rurais do município. O bambu é algo novo no Estado e pretendo detectar os produtores com interesse e providenciar mudas para começarem os plantios. ”

Membro da missão na Colômbia, o prefeito de Ibiraçu, Eduardo Zanotti, pretende incentivar o plantio do Guadua no município. “Nós temos que diversificar cada vez mais e gostaria de ver obambu produzir tão bem como na Colômbia. O bambu é mais uma opção de ganho para o agricultor e de suma importância para a preservação ambiental. A gramínea tem um papel muito importante,pois acumula água na época da chuva e durante a estiagem vai soltando essa água para sua própria produção ”, destaca.

O bispo emérito de Colatina e reitor do Santuário Diocesano Nossa Senhora da Saúde, em Ibiraçu, Dom Décio Sossai Zandonai, acompanha de perto a evolução do projeto. “Fiquei encantado com aproposta. Toda ideia inovadora vale a pena arriscar no sentido positivo da palavra, se não o agricultor fica sempre na mesmice”.

*LEIA A REPORTAGEM COMPLETA NA EDIÇÃO 27!

 

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