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Olivicultura

Doença de citros e café é detectada em oliveiras do ES

Atenção redobrada do produtor aos sintomas e manejo adequado podem minimizar o problema nas plantações

por Leandro Fidelis

em 21/08/2020 às 18h17

10 min de leitura

Doença de citros e café é detectada em oliveiras do ES

*Foto: Leandro Fidelis/Arquivo Safra ES

Uma das variedades da bactéria Xylella fastidiosa, conhecida por causar doenças na citricultura, foi detectada em amostras de oliveiras cultivadas na região serrana do Espírito Santo. Os testes foram realizados nos laboratórios do Centro Avançado de Pesquisa de Citros Sylvio Moreira,
ligado ao
Instituto Agronômico de Campinas (IAC).

O Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) vem acompanhando o caso e afirma não registrar novos casos desde novembro de 2019. Porém, os produtores devem ficar atentos ao problema para evitar prejuízos porque a patologia não tem cura. Em setembro, o Incaper vai lançar uma cartilha com orientações aos olivicultores.

A Xylella fastidiosa possui mais de 400 plantas hospedeiras, como citros, café, ameixa e oliveira e tem a cigarrinha como vetor. Os primeiros casos em oliveiras no Brasil foram registrados em 2015, na Serra da Mantiqueira, entre os Estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro.

Os galhos secos e com folhas amareladas são os principais sinais da doença denominada “Síndrome do Declínio Rápido da Oliveira ”. Em estágio mais avançado, as folhas caem e os ramos morrem.

“A bactéria entope os vasos e não permite passagem de água para a planta. Uma das diferenças
da antracnose, causada por fungo e já conhecida pelos agricultores, é que as folhas não caem logo no início da infecção ”, explica a biotecnologista e mestre em Produção Vegetal Nágela Safady, autora de um estudo sobre a Xylella fastidiosa.

Sintomas da Síndrome “Declínio Rápido da Oliveira” observados em árvores infectadas com Xylella fastidiosa. (*Reprodução dissertação Nágela Safady)


Apesar da proximidade com as plantações de café, os pesquisadores não podem afirmar se a bactéria migrou para os olivais ou se as mudas adquiridas pelos produtores, provenientes de Minas, estavam contaminadas. Como muitos olivicultores também são cafeicultores, a falta de informação os leva a achar que os sintomas da “Síndrome do Declínio Rápido da Oliveira ” são os mesmos verificados no café, a exemplo do déficit hídrico ou nutricional.

Mesmo sem consenso sobre a origem da contaminação, os especialistas ouvidos pela reportagem concordam que, ao contrário da Itália, que decretou Estado de Emergência após a contaminação de mais de 1 milhão de árvores, muitas delas centenárias, entre 2008 e 2013, o efeito da doença é mais brando no Brasil e o manejo correto pode garantir a sustentabilidade dos negócios. “É possível conviver com o problema e ter produção de azeitona. Para isso é importante realizar o manejo correto para não permitir a evolução da doença ”, acrescenta Nágela. (*Saiba mais abaixo).

A biotecnologista e mestre em Produção Vegetal Nágela Safady é autora do Instagram “Descascando a Ciência“, onde compartilha os resultados da pesquisa e desmistifica curiosidades sobre plantas e microrganismo. (*Fotos: Divulgação)


Viveiro suspende atividades em MG

De acordo com o pesquisador e coordenador do Programa Estadual de Pesquisa em Olivicultura da Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), Luiz Fernando de Oliveira, desde a suspeita da presença do patógeno nas oliveiras, o órgão procurou o Centro de Citricultura da APTA em Cordeirópolis (SP), referência em pesquisas com citros, cultura com prejuízos causados pela Xylella fastidiosa.

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Luiz Fernando relata que, desde a confirmação da bactéria nas oliveiras e a possibilidade da transmissão por mudas, a Epamig suspendeu as atividades do viveiro e iniciou processo de migração do sistema de produção de mudas do tradicional para o de produção sob telados antiafídicos, ou seja, um sistema protegido.

“Paralelamente a isso, começamos estudos em parceiras com o Centro de Citricultura e a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq – USP), tanto da bactéria e seu comportamento nas oliveiras, como também sobre como ocorre a transmissão de planta a planta, identificando espécies de cigarrinhas potencialmente transmissoras. Também foram realizadas ações com reuniões técnicas e palestras para discutir o assunto com os produtores ”, ressalta o pesquisador.

Luiz Fernando: Epamig
iniciou processo de migração do sistema de produção de mudas do tradicional para o de produção sob telados antiafídicos.


Origem incerta da patologia no Estado

O Espírito Santo conta com 200 hectares plantados com oliveiras e se aproxima da primeira colheita expressiva de azeitonas, prevista para fevereiro e março de 2021. A expectativa de safra é de 10,5 toneladas, grande parte em Santa Teresa, onde os primeiros plantios datam de 2015. Segundo a Associação dos Olivicultores (Olives), o Estado tem 110 produtores ativos, sendo 18 dentre os pioneiros que devem colher em breve.

Embora muitos agricultores tenham ingressado na olivicultura em 2015, as primeiras mudas plantadas em solo capixaba datam da década de 1950, afirma o doutor em Fitopatologia do Incaper, José Aires Ventura. “Temos isto arquivado, não sei ao certo, mas acredito que foram trazidas do Rio Grande do Sul e de Portugal pelos agrônomos Mendes da Fonseca e Júlio Pinho ”.

Para Ventura, esse fato histórico embaraça ainda mais identificar a origem da doença em oliveiras no Espírito Santo. “Não há como garantir. A bactéria pode ter vindo na muda ou já estar aqui há muito tempo. A Xylella fastidiosa é comum no Espírito Santo em café e citros desde as décadas de 1970 e 1980, mas está sob controle ”, conclui.

José Aires Ventura (Incaper): “O produtor não pode comprar muda de fundo de quintal”. (*Foto: Divulgação/Incaper)


O gerente de Defesa Sanitária e Inspeção Vegetal do Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf), Daniel Pombo de Abreu, confirma a presença no país da variedade da bactéria mais comum, causadora de doenças em citros. No entanto, informa que nenhuma das variedades da Xylella fastidiosa está na lista de pragas quarentenárias do Ministério da Agricultura (Mapa).

“Não fazemos análise periódica e não temos até o momento registro da presença de algum caso no Espírito Santo, seja no citros ou em oliveira. É obrigação do laboratório que faz análise e obtém resultado positivo informar as autoridades competentes ”, disse.

Pombo (Idaf): “É obrigação do laboratório que faz análise e obtém resultado positivo informar as autoridades competentes”.


Para Pombo, as preocupações com relação ao patógeno devem ser as mesmas para quaisquer culturas ou doenças. “É preciso investir muito em prevenção, com uso de sementes e mudas certificadas, de produtores registrados junto ao Mapa, e fazer a comercialização com documentação correta, que é o Certificado Fitossanitário de Origem (CFO), que garante a sanidade dos vegetais, juntamente com a Permissão de Trânsito Vegetal (PTV) ”.

O doutor em Fitopatologia do Incaper, José Aires Ventura, endossa o coro. “O produtor não pode comprar muda de fundo de quintal. Este é o primeiro cuidado, a origem das mudas. O segundo é ter área adequada para cultivar oliveira, com espaçamento e cuidado com as plantas, que são exigentes. Azeitona é uma fruta, não é como o eucalipto, que requer poucos cuidados. Diante disso, não vejo grande ameaça. Dá para conviver com a Xylella fastidiosa ”.

Preocupação e cuidados– O olivicultor e engenheiro agrônomo Fernando Madalon, de Alto Caldeirão (Santa Teresa), percebeu a morte descendente do tronco das plantas mais velhas da propriedade. Os pés não respondiam à adubação e à irrigação.

Por conta própria, o produtor coletou material para análise molecular no Instituto Agronômico de Campinas (IAC). De um total de três amostras, uma testou positivo para a Xylella fastidiosa. Ele e o pai investiram cerca de R$ 20 mil no cultivo e ficaram preocupados com a propagação da doença.

“Muitos produtores acostumados com café veem deficiências comuns a esta cultura e acham que com oliveiras é a mesma coisa, daí dobram volume de insumos ou acabam gastando mais no tratamento sem saber com clareza que patologia acomete a lavoura ”, diz Madalon.

Após a constatação do patógeno na área, os produtores adotaram algumas medidas. As plantas com menos de quatro anos de idade doentes foram eliminadas num processo conhecido como “roguing ” e posteriormente incineradas.

Outra medida, segundo Fernando, foi o controle do inseto vetor com a utilização de inseticidas microbiológicos. Os Madalon também realizam a poda dos ramos infestados, com posterior incineração, nutrição balanceada da planta com base em análise de solo, descartaram qualquer tipo de consórcio com plantas que podem ser hospedeiras, além de aplicarem manejo de plantas daninhas e utilizarem quebra-ventos para minimizar a dispersão da cigarrinha na área.

“Adotando essas medidas e convivendo com o patógeno na área, a gente vai conseguir manter uma boa produtividade e continuar com o intuito de produzir o azeite ”, conclui o produtor e agrônomo.


Poda e armadilha para cigarrinha no controle da bactéria

A poda dos ramos com sintomas, armadilhas para cigarrinhas e tratamento com cobre são as medidas recomendadas pelos especialistas para controle da “Síndrome do Declínio Rápido da Oliveira ”. O Incaper está finalizando a produção de uma cartilha com dicas para os produtores, que será disponibilizada em breve.

O pesquisador e coordenador do Programa Estadual de Pesquisa em Olivicultura da Epamig, Luiz Fernando de Oliveira, destaca que, primeiramente, o produtor deve observar os sintomas da doença no olival. Uma vez constatado, deve proceder a coleta do material e encaminhá-lo ao laboratório para diagnóstico.

Paralelamente a isso, o olivicultor deve eliminar a parte possivelmente infectada, ou seja, eliminar o ramo seco a aproximadamente um palmo abaixo, ainda com ramos e folhas verdes. “Esse material deve ser retirado do olival e queimado em local adequado ”, recomenda o pesquisador.

Os instrumentos utilizados para a limpeza da oliveira, como serrotes e tesouras de poda, devem ser desinfectados com uma solução de hipoclorito de sódio antes de se realizar alguma intervenção em outra planta.

“Caso o resultado do laboratório ateste positivo, o produtor deve realizar a retirada total da planta contaminada em questão, seguindo as mesmas orientações descritas acima. A presença de cigarrinhas também deve ser observada no olival. Para controlar o inseto na plantação, a dica é espalhar armadilhas amarelas com cola e fazer o devido controle da população de insetos, caso seja possível ”.

O doutor em Fitopatologia do Incaper, José Aires Ventura, defende ainda o tratamento com cobre. “O caminho é não fazer aplicação e inseticidas, porque não resolve. É possível conviver sem problemas com a Xylella fastidiosa com bom manejo e nutrição das plantas, numa estratégia integrada ”.

De acordo com Ventura, desde o final do ano passado os técnicos da extensão do escritório local do Incaper de Santa Teresa estão orientando os produtores. “Os produtores devem ficar de olho na lavoura e procurar os técnicos do Incaper a qualquer sinal da doença. Um pomar mal conduzido, com plantas com deficiência nutricional e possível presença da cigarrinha e da bactéria fecham o ciclo da doença ”, finaliza.

Luiz Fernando de Oliveira, da Epamig, avalia que a Xylella fastidiosa é uma bactéria com potencial para causar prejuízos ao produtor, mas destaca que existem maneiras de se mitigar o problema para a olivicultura capixaba avançar, assim como ocorreu com o citros.

“Os cuidados no manejo em campo, na produção de mudas e outras medidas fitossanitárias de controle não vão causar tantos danos e prejuízos ao olivicultor. O produtor deve ficar atento aos sintomas, fazer a correta utilização dos equipamentos de poda e adquirir mudas de viveiros idôneos para garantir que, caso haja a doença em seu olival, ela não se propague ”.

Nelmiro Broseghini é um dos produtores que apostaram na olivicultura capixaba. (*Foto: Leandro Fidelis/Safra ES)


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