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Animais silvestres em cativeiro: regulamentação pode gerar emprego, renda e afastar o tráfico das terras capixabas

por Fernanda Zandonadi

em 28/09/2023 às 6h35

6 min de leitura

Animais silvestres em cativeiro: regulamentação pode gerar emprego, renda e afastar o tráfico das terras capixabas

*Fotos: Danilo Monte-Mor/DIVULGAÇÃO

*Matéria originalmente publicada em 05 de setembro de 2022*

A criação de animais silvestres é um tema controverso, cheio de nuances. Se por um lado a conservação da fauna brasileira é cláusula pétrea da sustentabilidade ambiental, por outro, a não regulamentação da criação comercial desses animais em cativeiro pode ser uma porta aberta para a clandestinidade. Longe dos olhos da fiscalização, os animais podem sofrer maus tratos e serem vítimas de tráfico.

E o Espírito Santo pode ter bons aliados no combate ao que está às margens da lei: os criadores comerciais de animais silvestres. Com a atividade regulamentada e devidamente fiscalizada, promove-se o desenvolvimento regional, com uma ampliação dos horizontes do agronegócio. Nesse caso, animais criados em ambiente doméstico dão lugar àqueles apreendidos na natureza de forma ilegal. Famílias poderão diversificar a criação e gerar renda em pequenos territórios.

Além disso, há o desenvolvimento de toda cadeia periférica aos criatórios, como laboratórios, consultórios veterinários e fábricas de ração. O Estado também se beneficia na medida em que o desenvolvimento de novas cadeias produtivas aumenta a capacidade de arrecadação e de investimentos públicos.

Hoje, no Brasil e no Espírito Santo, há a licença para criador amador. Isso significa que, observadas todas as regras, é possível ter exemplares da fauna silvestre em cativeiro e, se for o caso, doá-las, não vendê-las. No Estado, por exemplo, são 30 mil criadores amadores cadastrados. O número de amadores pode ser maior, já que o levantamento foi feito pelo Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) em 2016.

Há criatórios comerciais, mas só podem operar aqueles que se cadastraram antes de 2007. Devido à ausência de legislação específica, novos criadouros comerciCriação comercialais estão impedidos de serem abertos em diversos Estados brasileiros desde então, como é o caso do Espírito Santo, que possui apenas dois criadouros comerciais de aves silvestres com licença de operação.

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E para ser um criador ambiental ou comercial de animais silvestres, há um processo de licenciamento ambiental que precisa ser seguido à risca. Essa legislação já existe. Mas falta, agora, saber quais animais entram nessa categoria e podem ser criados em cativeiro não apenas de forma amadora, mas para comercialização.

Essa categorização até foi tentada em 2007. O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) publicou a Resolução nº 394/07, que estabeleceu um prazo de seis meses para regulamentar quais animais silvestres seriam passíveis de comercialização. A lista envolveria, por exemplo, répteis (jacarés e cobras, para consumo de carne, couro e produção de soro antiofídico), mamíferos (paca) e aves para gastronomia (perdiz). Entrariam também, na lista, aves criadas como animais de estimação, como trinca-ferros, coleiros, canários da terra e curiós.

Mas, 15 anos depois, essa regulamentação ainda não saiu do papel. Nem sequer entrou, na verdade. E quaisquer aberturas de novos criatórios comerciais feitas de 2007 para cá, portanto, foram indeferidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

“Isso fere a igualdade de direitos. Não se pode dar renovação de licença para uma empresa, só porque ela foi aberta antes de 2007, enquanto impede-se que outras não obtenham essa licença. Fere a equidade de direitos civis e de pessoas jurídicas”, explica Danilo Monte-Mor, professor doutor em Administração e Contabilidade com mestrado em Economia e membro da Associação de Criadores de Pássaros de Vila Velha.

Mas o imbróglio é ainda maior. Em 2011, a Lei Complementar nº 140/11 passou para os Estados a função de fiscalizar – e regulamentar – quaisquer ações envolvendo animais silvestres, sejam elas comerciais ou amadoras. Mas falta um olhar mais atento para enxergar que essa é uma questão não apenas de proteção ambiental, mas de desenvolvimento regional.

“Há uma série de organizações não-governamentais que pressionam para que esses animais silvestres não sejam criados em cativeiro. Mas o que precisamos ter em mente é que a normatização da atividade coloca os criadores como aliados do Estado no combate ao tráfico de animais. E não o contrário. Todo o processo de criação é licenciado, monitorado e passível de fiscalização. Entretanto, para termos uma ideia, somente Paraná, Rio de Janeiro e Alagoas se anteciparam ao Conama e fizeram suas listas. Estados mais conservadores, como o Espírito Santo, ainda não regulamentaram a atividade em nível comercial”.

Segundo Monte-Mor, a Instrução Normativa Iema nº 006 de 2017 regulamenta a criação amadora no Estado do Espírito Santo. Ela institui a lista de animais que podem ser criados de forma amadora e definiu critérios referentes à reprodução, número de animais, autorização de transporte, participação em torneios, entre outros. Tal Instrução Normativa estipulou o prazo de um ano para a criação de normas específicas para criador comercial de animais silvestres no Espírito Santo. Até hoje, ela não saiu.

“Fizemos uma série de ações buscando uma resolução para a questão. Mostramos que, por uma defasagem na legislação, o Espírito Santo está perdendo uma chance de abrir novas frentes econômicas, gerando emprego e renda, com espécies que já são criadas de forma amadora”, explica o professor.

Criatórios comerciais e economia

A regulamentação de criatórios comerciais vai além da simples possibilidade de venda de animais, avalia o professor Danilo Monte-Mor. Ela fará o dinheiro girar ainda mais no campo e, melhor, com toda a responsabilidade, já que as regras para se manter esses animais em cativeiro e vendê-los prevê inúmeros cuidados e muita documentação. As rações que são oferecidas às aves, por exemplo, possuem todo um processo de controle de qualidade e de certificação. A rastreabilidade genética desses animais também é muito bem quista – e bem paga – por aqueles que os querem por perto. Isso significa mais trabalho para os laboratórios, veterinários e técnicos do setor. Isso falando apenas em aves de canto.

Mas se a enumeração de benesses chegar aos répteis, aves e mamíferos para a gastronomia, os ganhos são ainda mais evidentes. A venda desses animais para restaurantes e bares é realidade e, muitas vezes, as carnes precisam ser importadas de outros Estados por falta de criatórios por aqui. Para o homem do campo, em um Estado marcado por pequenas propriedades e terras caras, é uma forma a mais de manter a renda familiar. “O entrave legal, que pode ser facilmente sanado, não deixa que se façam investimentos por aqui. Não há segurança jurídica”, enfatiza Monte-Mor.

Na prática, há uma possibilidade gigantesca de desenvolvimento sustentável quando os criadores são parceiros do Estado. A oferta de animais com procedência também reduz a pressão pelo tráfico. A partir do momento em que os criadores se tornam parceiros do Estado, há um círculo de apoio para que essas criações sejam feitas com responsabilidade ambiental, com respeito à fauna e promoção de desenvolvimento regional.

 

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