Mulheres abraçam questões ambientais para fortalecer cooperativismo
Na região serrana do Estado, mulheres cooperativistas se destacam nas comunidades com ações focadas na preservação do meio ambiente
por Redação Conexão Safra
em 21/06/2017 às 0h00
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Na condução diária do transporte de mais 8.000 estudantes da sede e da zona rural de Afonso Cláudio, na região serrana, motoristas ligados à Cooperativa de Transportes local, a Cooptac, observaram uma mudança radical na paisagem ao longo do caminho. Nos últimos dois anos, a estiagem prolongada reduziu o volume de água nos pequenos córregos e também do Rio Guandu- o principal do município, além de transformar antigas cascatas em paredões de rochas secos, um cenário desolador.
A vontade de fazer algo para reverter esse quadro ganhou força quando o recém-formado Núcleo Feminino da cooperativa participou do encontro anual de mulheres, realizado em abril, em Aracruz. Na ocasião, a Organização das Cooperativas do Brasil- OCB/ Sescoop-ES propôs um projeto para as 30 cooperadas da Cooptac. E elas não tiveram dúvidas na escolha do foco ambiental das atividades com a criação do “Coopere com o Meio Ambiente e Adote uma Árvore ”.
De acordo com a diretora secretária da Cooptac, Renata Eller, a ideia é promover a recuperação das nascentes a partir do reflorestamento de áreas devastadas por proprietários rurais ou prejudicadas pela escassez de chuvas. A primeira ação do projeto foi o plantio de 85 mudas de árvores nativas em agosto, na localidade de São Vicente do Firme, a 19 quilômetros da sede de Afonso Cláudio, próximo à divisa com Brejetuba.
A propriedade escolhida para o piloto do projeto é a do casal de cooperados José Francisco Machado, de 51 anos, e Maria Madalena da Silva (39), ele um dos fundadores da Cooptac. Segundo o cafeicultor e também motorista, a região está bastante castigada com os efeitos da seca, mas o sítio da família garantiu suas nascentes graças à área de mata atlântica preservada.
Jatobá, jenipapo, jequitibá-rosa, ingá, cerejeira e gurindiba são as espécies escolhidas por serem ideais para a formação de matas ciliares. O local que ganhará uma nova floresta fica à margem do Córrego Caipora, que corta a propriedade de 77 hectares. José herdou o sítio do pai e afirma não ter visto uma crise hídrica como a atual. “O volume do córrego diminuiu muito. Ao contrário de muitos vizinhos, nossas nascentes se mantiveram, mas pelo menos três no caminho até a cidade secaram nos últimos três anos ”, conta.
Ele e a mulher, mais conhecida como Madá, receberam de braços abertos a iniciativa do Núcleo Feminino da Cooptac, que passará a acompanhar o crescimento das plantas mês a mês e promover outras ações semelhantes ainda neste semestre. Para a cooperada, o meio ambiente é um ponto que merece ser bem explorado no cooperativismo. “Atingir perto de 100% da população, conscientizando-a da importância de preservar nascentes, é o ponto chave do projeto. A informação pode ser replicada aos estudantes, que levarão aos pais até atender todas as famílias proprietárias rurais do município ”, aposta Madá.
Pelo futuro
Motorista há quatro anos junto à Cooptac, Elaine Kiefer (28) quer uma paisagem mais verde no seu caminho. “Vemos muito de perto o desmatamento e a falta d’água, dá para sentir na pele. Resolvemos começar esse projeto para tentar fazer algo pelo futuro ”, diz Elaine.
A professora e mulher de cooperado Aline Susi Ott Ratzke (26) disse acreditar que a quantidade de água vai aumentar à medida que mais árvores forem plantadas. “A importância desse projeto está na questão do aumento de água ”, ressalta.
Já a monitora de transporte escolar Lourdes Maria Pereira (45) aponta uma preocupação com o futuro da família. “Nosso principal rio, antes tão cheio, hoje é quase um córrego. Como mãe e avó, fico pensando se meus netos verão o mesmo rio onde eu cheguei a tomar banho um dia. ”
Diferença
No município vizinho de Santa Maria de Jetibá, o meio ambiente e a sustentabilidade também estão na pauta no Núcleo Feminino Cooperativista do Sicoob Centro-Serrano. Formado por 20 mulheres de diferentes profissões e moradoras da sede, o grupo quer fazer a diferença com a implementação de ações voltadas para o bem estar da população das zona rural e urbana.
O núcleo tem contribuído com o paisagismo do município, com a implantação de um jardim botânico na escola de Vila Jetibá, em parceria com a prefeitura, e também desenvolve um projeto para limpeza do Rio São Sebastião, que corta o perímetro urbano de Santa Maria, além de incentivar a coleta seletiva do lixo.
Segundo a funcionária da agência do Sicoob local e coordenadora de projetos sociais do Núcleo, Suely Kurth Dettmann Candeia, a próxima meta é realizar a coleta de óleo de cozinha usado para transformá-lo em biodiesel. “Ainda estamos engatinhando, aprendendo a ser núcleo feminino, porém os princípios cooperativistas facilitam muito o trabalho com as mulheres. Temos muitas demandas na área ambiental, que estava muito carente no município ”, afirma Suely.
Agitadoras nucleares
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O projeto “Coopere com o Meio Ambiente e Adote uma Árvore ”, realizado pela Cooptac, e as ações em SantaMaria Jetibá, por meio do Sicoob Centro-Serrano, são alguns exemplos de como os núcleos femininos fortalecem as cooperativas capixabas nas comunidades onde estão inseridas. Antes atuantes apenas no setor agropecuário, as mulheres cooperativistas estão agora presentes nas áreas de crédito, saúde e, de forma inédita, na de transporte.
De acordo com a Organização Brasileira das Cooperativas- OCB/ES, o Núcleo Feminino da Cooptac é o pioneiro no Brasil formado por uma cooperativa de transporte escolar. O grupo está sempre atento à integração do Quadro Social e ainda participa de cursos para aumentar a renda familiar.
Assim como outras equipes femininas, o núcleo tem a sorte de contar com mulheres com muita facilidade em mobilizar pessoas, verdadeiras agitadoras nucleares. É o caso da diretora secretária, Renata Eller, para quem o cooperativismo amplia os benefícios para a população. “O Núcleo Feminino mostra a força da mulher junto com o cooperado. Quem é cooperativista tem que ter na veia a essência do cooperativismo, multiplicar os benefícios, ajudar o próximo e não ficar à mercê do capitalismo ”, define.
A monitora de transporte escolar Valnice Caetano de Vargas Ferreira (34) enumera os motivos de sua participação. “É muito importante esse núcleo para minha vida, me motiva saber que a família toda está envolvida nesse trabalho, criar novas amizades e ver mudança na autoestima dos motoristas, que estavam muito distantes das iniciativas da cooperativa. ”
O presidente da OCB-Sescoop/ES, Esthério Sebastião Colnago, destaca que, quando as mulheres ficam mais próximas das ações das cooperativas, elas começam a colocar seus maridos e filhos também mais responsáveis pelo dia a dia da instituição. Atualmente, mais de 300 mulheres atuam em grupos no interno de oito cooperativas do Estado. “As mulheres são um pilar na constituição da família e, dentro das cooperativas, não é diferente. São as mulheres que guiam os homens e os fazem pensar de forma emocional e também racional. O surgimento dos núcleos femininos veio exatamente desse propósito, como uma forma de inclusão das mulheres no quadro social das cooperativas ”, avalia.
Ainda segundo Colnago, a atuação feminina estimula a criação de outros núcleos nas cooperativas capixabas. “Além de participarem ativamente da vida das cooperativas, do quadro social delas, essas mulheres estão tendo vida própria, traçando novos caminhos. Algumas até já fazem parte das reuniões dos conselhos. Elas são um verdadeiro exemplo! ”, completa o presidente da OCB-Sescoop/ES.
Grupo conquista respeito e vira referência em Vila Pontões
Grupo de Mulheres Empreendedoras do distrito, na zona rural de Afonso Cláudio, se consolida e replica experiência em coletividade feminina. Próximo passo é formalizar agroindústria .
Com cerca de 20 participantes, o Grupo de Mulheres Empreendedoras de Vila Pontões, distrito da zona rural de Afonso Cláudio, conseguiu ir muito além da proposta inicial de apenas gerar renda alternativa à agricultura com a produção de bolos, pães, biscoitos e doces.
Após sete anos do primeiro evento organizado pelo núcleo cooperativista, quando ainda era ligado à Cooperativa dos Cafeicultores das Montanhas do Espírito Santo- Pronova, atualmente substituída pela Coopeavi, as mulheres são referência em organização e dedicação ao bem coletivo, o que inclui tornar o pequeno vilarejo mais sustentável a partir de pequenas e significativas ações.
O primeiro passo foi pintar as paredes da antiga sede do posto de saúde, disponibilizado ao grupo pela prefeitura em contrato de comodato, por meio do projeto “Cores da Terra ”, do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural- Incaper. A técnica resgata a tradição do barreado para colorir paredes. “Era nítido o descrédito de alguns moradores ao assistirem nosso mutirão pintando a sede sem o uso de tinta convencional ”, diverte-se a agricultora Elza da Penha Delpupo Zambon (62).
As demandas vêm de toda parte: apoio na cozinha das festas da escola e da igreja e até no auxílio para a tomada de decisões importantes nessas instituições. “Nosso grupo resolve de primeira. Nunca negamos ajuda, e a união faz toda a diferença ”, afirma Josane de Souza Lima Bissoli (35). “Quando damos apoio, ele vem com mais resolutividade ”, completa Jucelena Braga Santos (40).
E o meio ambiente agradece essa força feminina. No ano passado, a partir da ideia de duas moradoras, o grupo conseguiu arrecadar mais de 40 pneus em desuso, além de plantas que os habitantes tinham em casa, para dar cara nova aos jardins da pracinha em frente à Igreja Católica. Árvores antes sem visibilidade agora têm sua beleza realçada pela intervenção dessas mulheres.
As necessidades são diversas e a lista do Núcleo conta com pedidos de plantio de mudas para recuperação de nascentes. “Estamos servindo de exemplo bom e replicando isso para outras comunidades ”, comemora Josane. “Nosso grupo se fortaleceu ao resgatar os valores da comunidade ”, finaliza Teresinha Vidal Zambon (65).
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