Associação de Santa Maria é destaque na região sudeste do Brasil
A “Amparo Familiar” mobiliza mais de 1.000 moradores do município que, juntos, produzem 250 toneladas mensais de orgânicos em propriedades rurais devidamente certificadas
por Redação Conexão Safra
em 21/06/2017 às 0h00
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Com 90 famílias filiadas, a Associação de Agricultores e Agricultoras de Produção Orgânica Familiar de Santa Maria de Jetibá (Amparo Familiar), nas montanhas capixabas, já é apontada como a maior do ramo no Sudeste do Brasil. A entidade mobiliza mais de 1.000 pessoas que, juntas, produzem 250 toneladas mensais de orgânicos em propriedades rurais devidamente certificadas. Localizada em Alto Santa Maria, a 18 quilômetros da sede do município, a associação inaugurou sua sede em setembro e vem ampliando as suas praças na região metropolitana do Estado.
Por meio da associação, os agricultores comercializam de 65 a 80 variedades de frutas, legumes, verduras, temperos e plantas medicinais. Num mercado que cresce 30% ao ano, segundo o projeto “Organics Brasil ”, a abertura das feiras, supermercados e shoppings da Grande Vitória para itens das hortas serranas mostra a disposição do capixaba em pagar mais por produtos saudáveis e colaborar para o desenvolvimento econômico e social na zona rural do Estado.
A Amparo Familiar foi criada em 2001 com o objetivo de ampliar a venda de produtos orgânicos e aumentar a renda das famílias de Alto Santa Maria, onde muitos agricultores- a maioria de origem pomeranativeram problemas de saúde ou morreram no passado em consequência do uso indiscriminado de agrotóxicos nas lavouras de tomate e alho. No ano seguinte à fundação da associação, aconteceu a primeira feira de produtos orgânicos do Espírito Santo, promovida com apoio do governo do Estado, aumentando a visibilidade de produtos cultivados sem o uso de substâncias que coloquem em risco a saúde humana e o meio ambiente.
Quem conta essa história de sucesso é a presidente da Amparo Familiar, a agricultora orgânica Selene Hammer Tesch, 53 anos, dona do Sítio Tesch e liderança reconhecida na localidade que ajudou a transformar, a partir de 1992. Ela enfrentou solitária o preconceito e a resistência dos vizinhos ao mudar a forma de produzir alimentos. Preocupada com a saúde dos filhos, Selene passou a evitar os agrotóxicos e trabalhar com a agricultura orgânica. A agricultora decidiu então buscar informações sobre o método e, em 1993, participou da primeira feira de produtos alternativos e sem agrotóxicos implantada em Santa Maria de Jetibá e em Vitória.
No início houve muita dificuldade para aprender, produzir e participar da comercialização, já que os alimentos orgânicos ainda não eram tão conhecidos e procurados. “Começamos com doze produtores, os doze ‘apóstolos’ (risos). Fomos chamados de vagabundos, preguiçosos, doidos… ”, lembra Selene. Mas ela não desistiu. Participou de diversas capacitações, palestras, seminários, buscou a parceria de outros produtores até a fundação da associação.
Os esforços continuaram e aos poucos vieram as conquistas: em 2005 a feira de produtos orgânicos em Vila Velha, em 2010, feira em Valparaíso, na Serra, em 2012 as feiras na Praça do Papa e Serra Sede e em 2014 a feira em Colinas, Laranjeiras. Desde então, o grupo só avançou e, atualmente, são 13 pontos para comercialização de 200 tipos de orgânicos, incluindo os shoppings da região metropolitana. Selene explica o sucesso das feiras: “O diferencial está na produção sem uso do agrotóxico e insumos químicos, trabalho com mão de obra familiar e venda direta, vínculo entre consumidor e produtor, principalmente visando à qualidade de vida de todos envolvidos ”, explica a agricultora. “Buscava melhoria na qualidade de vida da minha família, e hoje proporciono o mesmo aos meus clientes e tenho retorno financeiro ”, continua Selene, campeã da etapa estadual do Prêmio Sebrae Mulher de Negócios 2014, na categoria produtora rural.
Novo capítulo
A inauguração da nova sede da Associação de Agricultores e Agricultoras Orgânicos Familiares de Santa Maria de Jetibá (Amparo Familiar), no último dia 18 de setembro, marca um novo capítulo na história do grupo. A obra foi erguida com recursos próprios e está adaptada para o manuseio dos produtos, conforme os padrões sanitários legais. Além da estrutura física, a associação conta com um caminhão e uma Van para facilitar o deslocamento dos produtores e a logística dos produtos até a Grande Vitória.
Para se associar, o agricultor orgânico contribui com uma taxa mensal e precisa ter a propriedade certificada. De acordo com o agrônomo do Incaper local Galderes Magalhães, em parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae/ES), cada produtor conta com certificado de conformidade orgânico e participa constantemente de capacitações para melhorar os negócios.
Os associados colhem os frutos, mas não só na terra. “A gente percebe a diferença na roça mesmo. A produção orgânica é um ótimo negócio, é rentável e os produtos são mais valorizados ”, destaca a agricultura Rosineia Benevitz (28), casada com Pedro Neitzke (31), ambos com sítio certificado há um ano. “Hoje, minha venda é direta, sem a necessidade de atravessadores. É muito melhor o contato direto com o consumidor, sempre interessado em saber como é nossa produção ”, completa o agricultor.
Já o agricultor Jeferson Strey Arnholz (30) enfatiza a estabilidade do preço dos orgânicos. “Não ficamos à mercê da cotação de preço dos produtos convencional. Agora produzo o ano todo e encontro na própria roça as plantas repelentes que evitam o uso de defensivos. Dá para sentir o verdadeiro sabor do tomate e outras hortaliças ”, diz Arnholz.
‘É possível produzir em grande escala’, diz agrônomo
Utilizando as tecnologias certas é possível produzir orgânicos em grande escala. A afirmação é de Fábio Morandi de Moraes, engenheiro agrônomo e mestre em fitossanidade do escritório do Incaper de Guaçuí, no sul do Estado.
Para o extensionista, o mito se desfez com as plantações de cana-de-açúcar, soja e milho em grandes áreas. “O principal fator que todo agricultor que pretende produzir alimentos orgânicos deve priorizar é o manejo ecológico do solo. Hoje em dia é possível coletar os microrganismos benéficos, criá-los e aumentar sua população para aplicar no solo e potencializar sua fertilidade ”, declarou Morandi.
No entanto, o agrônomo destaca o alto custo da certificação das propriedades como impedimento para a maioria dos agricultores interessados nesse segmento. No Espírito Santo, existem pouco mais de 300 propriedades reconhecidas. Um dos mecanismos de certificação, o selo “Orgânicos Brasil ”, por exemplo, é concedido de duas formas: ou por certificação por auditoria ou pelo sistema participativo de garantia da qualidade orgânica, o que ainda não está disponível no Estado.
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Nesse contexto, observa Morandi, existem órgãos como o Sebrae que dão subsidio no início do processo de certificação. “Outro fator importante é a falta de profissionais que dão assistência técnica em agricultura orgânica e agroecologia. Muito timidamente algumas universidades estão inserindo nas grades curriculares esses temas. ”
E além de proporcionar mais saúde, os custos com a produção de orgânicos chegam a ser 40% menores em relação aos convencionais, afirma o agrônomo. “Hoje é possível pagar um preço similar aos convencionais adquirindo alimentos diretamente do agricultor em feiras livres, sistemas de delivery, entregas de cestas, entre outros ”, avalia. Ainda segundo Morandi, um dos principais motivos de os orgânicos serem mais caros em determinados mercados é a lei da oferta e procura. “Nem tanto os custos de produção. Estimular a produção e consumos locais de orgânicos é fundamental para levar saúde para as famílias e gerar renda sustentável para os agricultores. ”
Alho orgânico em padrão comercial em Domingos Martins
Um estudo inédito no Espírito Santo e no Brasil sobre alho orgânico promete um produto de padrão comercial a partir de plantas com alta produtividade cultivadas em canteiros lonados. Os experimentos ocorrem na Unidade de Referência em Agroecologia, no Centro Regional de Desenvolvimento Rural do Incaper, na Fazenda do Estado (Domingos Martins).
Iniciada em 1990 como parte do programa de agroecologia do Incaper, a pesquisa é coordenada pelo doutor em agroecologia Jacimar Luis de Souza e detectou ser a variedade dentro do grupo “Amarante ”, com alhos de peso médio elevado, a mais apropriada para as técnicas, já disponíveis para os agricultores.
“Para se plantar alho orgânico, a propriedade deve estar com equilíbrio ecológico estabelecido pelas várias práticas agroecológicas de caráter geral, como biodiversidade, solos enriquecidos com matéria orgânica, adubação verde, manejo de mato com corredores de refúgio, entre outras medidas. A produção deve ser vista nesse contexto de propriedade orgânica ”, destaca Jacimar.
Segundo o pesquisador, a cultura é exigente de nutrientes e possui grande suscetibilidade de ocorrência da doença Mancha Púrpura do Alho, ocasionada pelo fungo Alternária porri, que prejudica muito a produtividade. Por essa razão, os estudos científicos focaram, entre outros aspectos, no uso de espaçamentos maiores que os tradicionais. “Para produzir alhos orgânicos com peso médio maior, o recomendado é 30 centímetros entre linhas e 15 cm entre plantas ”, ressalta o pesquisador.
A Unidade de Agroecologia do Incaper em Domingos Martins também é referência em experimentos com resgate, seleção e multiplicação de variedades crioulas de tomate. O estudo consiste na seleção de variedades mais adaptadas ao sistema orgânico. São trabalhadas mais de 11 variedades da fruta que estão disponíveis para os agricultores.
58ª ExpoAgro fortalece raízes rurais de Guaçuí
Nos últimos anos, Guaçuí tem procurado realizar as festas da cidade com muito “pé no chão ”. E o meio encontrado foi promover eventos que resgatem a força da agropecuária local e com a colaboração de profissionais do município.
Prova disso foi a 58ª ExpoAgro realizada entre 22 e 25 de setembro, que teve como objetivo o fortalecimento da agricultura capixaba por meio da pecuária de leite, das agroindústrias e da agricultura familiar, em uma iniciativa conjunta do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), Prefeitura Municipal – por meio da Secretaria de Agricultura, Sindicato Rural, Sindicato dos Trabalhadores Rurais, Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo (Idaf), Cooperativa de Produtores Rurais do Espírito Santo (Coopres) e Colagua.
A programação técnica foi direcionada à produção de cafés especiais; Agricultura Orgânica e Sustentabilidade; Produção Intensiva de Leite a Pasto; Cultivo de Palmáceas; Agroturismo e Agronegócio na região; Recuperação de pastagens degradadas e Linhas de Crédito. Ainda na programação foram ministradas palestras referentes à pecuária e café, com debates sobre o mercado de café arábica e Indicação Geográficas (IGs) da cultura. O Senar ministrou minicursos de culinária de café, cordeiro, pães e pizzas artesanais.
De acordo com o chefe do escritório local (ELDR) do Incaper de Guaçuí, Maxwell Souza, o evento oportunizou aos agricultores familiares e produtores rurais a potencializar o conhecimento das cadeias produtivas trabalhadas, bem como ampliar as oportunidades no campo.
Dentre a programação também foi realizado Concurso Leiteiro nas categorias 25 Kg e 35 Kg. Já para o julgamento de bezerras, foram aceitos animais de 8 a 24 meses. Também fez parte desta edição, a II Mostra de Café com Qualidade. Além das atividades agropecuárias, o público contou com shows regionais e uma praça de alimentação com comerciantes do município.
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