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Baunilha, uma especiaria de luxo em terra capixaba

Fazenda de São Mateus é a única produtora de baunilha, segunda especiaria mais cara do mundo, no Espírito Santo

por Rosimeri Ronquetti

em 21/09/2023 às 6h28

6 min de leitura

Baunilha, uma especiaria de luxo em terra capixaba

*Fotos: Divulgação

*Matéria originalmente publicada em 05 de janeiro de 2022*

Localizada em Nestor Gomes, interior de São Mateus, no Norte capixaba, a fazenda Cachoeira do Cravo é a única produtora de baunilha do Espírito Santo e uma das poucas no Brasil. São 400 pés da espécie Vanilla Planifolia, única orquídea a produzir frutos comestíveis e que contêm diversos compostos aromáticos. 

Em uma viagem ao Taiti, em 2014, o casal Ana Lúcia e Cláudio Antônio Coser, proprietários da fazenda, viram pela primeira vez uma plantação de baunilha. Para eles, além da surpresa com o plantio em si, foi ver ao lado tinha uma plantação de pimenta-do-reino, cultura já existente na propriedade em São Mateus. 

De volta ao Brasil pediram ajuda de um amigo orquidófilo para auxiliar com as mudas de baunilha e, em 2016, implementaram a ideia com 50 pés da espécie. Este ano foi feita a segunda colheita das favas e, pela primeira vez, fizeram a cura da baunilha para comercialização. 

“Viajamos ao Taiti para comemorar trinta anos de casados, quando vimos pela primeira vez uma plantação de baunilha ao lado da pimenta do reino. Pesquisamos, arriscamos e tivemos muita paciência até elas ficarem como queríamos”, conta o produtor. 

Ainda muito precoce e em fase de testes, o casal prefere não falar em quantidades de produção e comercialização, mas já planejam aumentar o plantio. “Estamos no início de um projeto, ainda nos estruturando e com planos de ter mais viveiros e de aperfeiçoar todos os processos pelos quais a fava de baunilha precisa passar para ficar pronta para consumo”, revela Cláudio. 

Vale ressaltar que a baunilha, devido à mão-de-obra necessária na produção das vagens, é a segunda especiaria mais cara do mundo, só perde para o açafrão. Em 2018, o quilo ficou ligeiramente mais caro que o da prata, atingindo, na época, um pico de US$ 600, cerca de R$ 2.400. 

Pouca informação faz do cultivo um desafio

No Brasil, poucas pessoas já viram uma planta de baunilha, apesar de muitos estarem familiarizados com substâncias similares, como as essências muito usadas na culinária e na perfumaria. Existem cerca de 100 espécies de baunilha, porém, o país tem pouca tradição no cultivo da planta. A maioria das plantações brasileiras são pequenas, fazendo a produção ser considerada incipiente.

Pedro Yoshinaga, biólogo da Universidade de São Paulo (USP), diz que o cultivo no Brasil é raro e que essa foi a primeira vez que teve contato com a planta. “Não acompanhei nenhuma outra implantação dessa cultura em outro lugar. Pelo que eu saiba, existe cultivo comercial, mas coisa bem pequena, no Estado da Bahia, fazendas com mil pés, nada que tenha um volume significativo”, destaca o especialista. 

Apesar da adaptação ao clima ser muita boa, Yoshinaga diz que alguns problemas são difíceis de resolver por falta de estudos sobre plantios de baunilha no país. O principal desafio é a falta de informação sobre o plantio/cura em português.

“A adaptação das plantas ao clima quente e úmido, na maior parte do tempo, é boa. No entanto, não é fácil de cultivar devido à falta informação.  Os estudos que temos, documentação, dados, uma boa base cientifica, não são para plantações no Brasil”, pontua o biólogo.  

Itens importantes em qualquer cultivo, na baunilha se tornam um desafio, segundo Pedro. “Controle de praga, clima específico, ventilação, calor, época de chuvas, a gente tem que ir descobrindo. O controle de praga, por exemplo, as daqui não foram estudadas. Os estudos que temos são para plantações em outras regiões. As pragas específicas daqui são quase impossíveis de combater com métodos convencionais. Não temos nenhum produto ou estudo, temos que combater com base no que sabemos de outros tratamentos”. 

Com todas as informações em inglês, o preparo da mão de obra para lavoura também fica prejudicado. A mão de obra pode se tornar manejável caso haja alguém capacitado para realizar pesquisas e acompanhar as etapas do plantio.

“A dificuldade para obter informação prejudica o aprendizado, e a falta de estudos em português dificulta ainda mais o acesso às informações de como plantar/curar baunilha para brasileiros que não falam inglês”, destaca o produtor Cláudio Coser.

O cultivo deve ser feito em local sombreado, e os pés da planta são fixados em estacas, como no cultivo da pimenta. “Por ser uma planta que não pode ser exposta ao sol diretamente, o plantio deve ocorrer em local com cobertura que deixa passar apenas 50% do sol. Na natureza, ela fica em meio às árvores que se encarregam de fazer sombra”, ressalta Pedro Yoshinaga. 

Para produzir baunilha é preciso manter a planta em umidade alta o tempo todo, por isso necessita de irrigação. 

Processo de polinização e cura das favas

Para que as favas da baunilha aconteçam, o biólogo da USP explica que é realizada uma técnica de polinização manual das flores que se abrem pela manhã. Isso torna possível a formação das favas, que maturam acumulando vanilina, substância que dá o aroma, por um período de aproximadamente nove meses. Quando maduras são colhidas uma a uma e passam por algumas etapas para secar e curar, o que leva por volta de três a seis meses. 

“Para conseguirmos vender uma safra de dez mil favas são necessárias dez mil polinizações manuais de flores. Depois de maduras, essas favas são colhidas individualmente e passam pelas etapas de cura e secagem. Ou seja, é necessária uma grande quantidade de trabalho manual para que haja uma colheita produtiva e de alta qualidade”, esclarece Cláudio.

De acordo com Pedro, apesar de trabalhoso, o processo de cura das favas não muda muito nas diferentes regiões do mundo. “O processo de cura é trabalhoso, porém, os estudos relacionados a esse processo são mais fáceis de se obter. É a área que se tem mais estudos”. 

O biólogo explica que quando a fava está verde não tem cheiro, nem essência de baunilha. O beneficiamento começa com as favas sendo escaldadas em água quente, o que dá início à formação do aroma na planta, intensificado à medida em que ocorre o processo de cura. Uma armazenagem de seis meses acentua o sabor e o aroma. 

Apesar da boa adaptação, Yoshinaga diz que o principal desafio é a falta de estudos sobre baunilha no país.

Curiosidades sobre a baunilha

A baunilha é uma orquídea trepadeira que pode atingir até 10 metros de comprimento, cujos frutos são vagens de 10 a 25 cm de comprimento e 5 a 15 cm de diâmetro é também a mais conhecida e comercializada no mundo todo. 

O maior produtor do mundo é Madagascar, seguido da Indonésia. Apesar de muito presente na culinária de povos europeus, a baunilha tem origem no México e em alguns países da América Central. Os povos nativos das Américas a utilizavam na culinária desde antes da chegada dos europeus. 

Os europeus tentaram produzir favas de baunilha em suas colônias, fora das Américas, porém, não conseguiam obter frutos, já que não havia os insetos polinizadores que realizavam essa função. A produção só se tornou possível por volta de 300 anos depois da descoberta da iguaria.

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