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“Ela serve de alimento e abrigo para diversas espécies, é de valor nutricional riquíssimo, tem importância cultural para comunidades tradicionais e ainda proporciona uma beleza cênica única.”
A descrição de Fabiana Ruas, extensionista do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), sobre a palmeira juçara (Euterpe edulis), não deixa dúvidas: com tantas qualidades, a planta é mesmo a rainha da Mata Atlântica.
Nativa do bioma, a juçara não é apenas símbolo de biodiversidade. “É uma indicadora de ambiente de qualidade e tem valor imenso para a agricultura familiar. Estima-se que cerca de 200 produtores estejam envolvidos com a produção de juçara, resultando em 900 toneladas de frutos e 700 toneladas de polpa, além de diversos outros produtos”, afirma Fabiana, ao comentar a importância do cultivo em Rio Novo do Sul, município que recebeu o título de Capital Estadual da Juçara, por meio da Lei nº 11.583. A cidade lidera atualmente uma das cadeias produtivas mais promissoras e sustentáveis do Espírito Santo.
O que é a palmeira juçara
Para além de sua relevância econômica, a palmeira juçara exerce papel fundamental na manutenção dos ecossistemas florestais. Seus frutos alimentam aves, mamíferos e diversas outras espécies da fauna. Visualmente semelhante ao açaí da Amazônia, o fruto da juçara tem alto valor nutricional e pode ser aproveitado na produção de polpas, sucos, geleias, sorvetes e outros derivados — fomentando o desenvolvimento sustentável e a geração de renda para pequenos produtores.

A extração do palmito, no entanto, é proibida, pois resulta na morte da planta, que integra a lista de espécies ameaçadas de extinção. A alternativa legal e sustentável é o aproveitamento do fruto, cuja cadeia produtiva vem sendo incentivada por políticas públicas e iniciativas locais.
A experiência de Rozali e Evanilço Schaider
Moradores da comunidade de Virgínia Nova, na zona rural de Rio Novo do Sul, Rozali Fortuna Schaider, de 46 anos, e Evanilço Santo Castelarie Schaider, de 50, são exemplo de como o cultivo da juçara pode transformar a vida de agricultores familiares. Com mil pés em produção e outras mil mudas recém-plantadas, o casal investiu na diversificação de produtos e na industrialização da matéria-prima.
A motivação veio de uma necessidade ambiental. “O dono da fábrica de polpas nos procurou pedindo ajuda com um problema ambiental causado pelo excesso de resíduos da produção”, conta Evanilço. Ele passou, então, a testar o aproveitamento das sementes — secando, torrando e moendo — até chegar a um pó com potencial nutricional. Foram 19 dias de testes, realizados inicialmente com um torrador manual.

Os resultados surpreenderam. “Fizemos análises e vimos que o produto tinha muitos nutrientes. A partir daí, decidimos investir”, relata. O casal firmou sociedade com o empresário Pedro Bortolotte e sua esposa, criando as marcas Grão Juçara Brasil e Juçara Nutrição Animal.
Adubo, ração e “café” de juçara
O primeiro produto desenvolvido foi um adubo orgânico, que começou a ser testado em 2018 e teve seu registro oficializado em 2021. “O maior desafio foi provar para os produtores que o adubo realmente funcionava”, lembra Evanilço. Para isso, ele aplicou o produto nas próprias lavouras de café, banana e cítricos. Após 90 dias, os resultados — em qualidade e produtividade — chamaram a atenção da vizinhança.
A demanda aumentou, e hoje o adubo é vendido para municípios como Cariacica, Santa Teresa, Domingos Martins, Iconha, Alfredo Chaves, Mimoso do Sul, Cachoeiro de Itapemirim, Vargem Alta e o próprio Rio Novo do Sul.
Outro investimento foi na produção do pó de juçara para consumo humano, semelhante ao café. “Pode ser coado ou feito em cafeteiras. Também pode ser usado em bolos, pudins, doces e misturado ao leite”, explica Evanilço. O produto está em processo de registro na Anvisa.
Além disso, desenvolveram uma ração animal feita a partir do caroço do fruto, com um processo de secagem distinto do utilizado para o pó. A ração já foi registrada no Ministério da Agricultura, e o casal se prepara para iniciar a produção em fábrica própria, prevista para começar a operar em agosto.
Sustentabilidade e inovação
Sem formação técnica, o casal enfrentou desafios desde o início. “Pensamos em desistir muitas vezes, principalmente pelas dificuldades nas análises técnicas. Mas com perseverança, superamos tudo. Hoje temos técnicos que trabalham conosco, mas todos os processos de desenvolvimento foram feitos por nós”, afirma Rozali.
O investimento total — entre testes, análises, equipamentos e estrutura da fábrica — ultrapassa R$ 850 mil. Parte dos resíduos utilizados era, inicialmente, compostada por até sete anos antes de virar adubo. Com o avanço das tecnologias e melhorias nos processos, o ciclo foi encurtado, com eficiência e sustentabilidade.
O uso do grão torrado em rebanhos confinados também mostrou resultados positivos, aumentando a procura. “Está apresentando um resultado muito bom para o gado de leite e de corte”, afirma Evanilço, que já exporta o grão para um parceiro comercial.

*Fotos: arquivo pessoal
Rede Juçara-ES
A atuação do casal faz parte de uma mobilização mais ampla. Desde março de 2022, o Incaper coordena a Rede Juçara-ES, um fórum de debates sobre a cadeia produtiva da juçara com o objetivo de fortalecer os derivados do fruto no mercado nacional e internacional.
Além de Rio Novo do Sul, fazem parte da rede outros 24 municípios capixabas, com destaque para Vargem Alta, Conceição do Castelo, Santa Teresa, Marechal Floriano, Muniz Freire e Ibatiba.
Para Fabiana Ruas, o sucesso da cadeia produtiva da juçara no Espírito Santo é uma demonstração de que conservação ambiental, cultura tradicional e geração de renda podem andar juntas.
“A juçara é muito mais do que uma planta: é um símbolo de resistência e de possibilidades para o campo e para a floresta”, resume.




