Covid-19: agricultores da ‘Horta do ES’ vivem drama com suspensão das feiras
Crise afeta produtores de hortaliças de Santa Maria de Jetibá, maior município em produção agropecuária do Estado, que perderam o principal canal de venda neste período de pandemia
por Leandro Fidelis
em 23/05/2024 às 0h04
7 min de leitura
Matéria publicada originalmente 03/05/2020
Agricultores familiares que dependem exclusivamente das feiras livres na Grande Vitória e no interior do Espírito Santo para garantir renda estão sofrendo com a suspensão dos eventos por causa da pandemia do novo coronavírus (Covid-19).
As feiras são o principal canal de venda destes produtores, principalmente de Santa Maria de Jetibá, considerada a “Horta do Espírito Santo ” pela maior produção agropecuária do Estado.
Enquanto as feiras de Vitória, Cachoeiro de Itapemirim e Linhares voltaram a funcionar, seguindo as medidas de segurança recomendas para evitar o surto da Covid-19, cidades como Colatina e Fundão mantêm a suspensão por tempo indeterminado.
Sem acesso direto aos consumidores e perspectivas de investimento nas lavouras, os agricultores temem ter que comercializar a produção via atravessadores por valores bem abaixo dos praticados nas feiras da agricultura familiar.
O agricultor Lindomaro Ludtke, de Baixo Rio Plantoje (Santa Maria de Jetibá) está há cinco semanas sem fazer feira em Jerônimo Monteiro, no Sul do Estado. “A gente se organiza na roça para vender diretamente para o consumidor. Parado, fica difícil vender por atravessador, que paga menos pela mercadoria ”, disse.
Rosana Márcia Reckel (na foto em destaque) vive na localidade de Alto Santa Maria, também na zona rural de Santa Maria. Ela e o marido, Deucimar Schumach,produzem temperos, tomate, pimentão, pepino entre outras hortaliças e participam semanalmente da feira livre de Colatina, no Noroeste do Estado.
“Tudo o que produzimos vendemos na feira, não conseguimos estocar nossos produtos. A gente vai planejando as coisas que queremos fazer e, de repente, se depara com essa dificuldade. Tudo que a gente planta requer investimento: semente, energia, esterco, adubo… ”, declara Rosana.
Desde o início da pandemia, o casal ainda não fez feira e vive o dilema de continuar ou não na atividade.
“A gente se vê numa situação duvidosa: se continua plantando ou se para. Se os governantes não nos ajudarem a comercializar, vamos perder muito. Se não plantar, não tem renda. Nós somos uma das linhas de frente diante dessa crise toda, muitas pessoas dependem do nosso trabalho ”, relata a agricultora.
O casal Stefani Buss e Marcel Storck, de Alto Rio Triunfo, outra localidade produtora de Santa Maria, conta que ele e alguns vizinhos estão perdendo a colheita de hortaliças por falta de compradores desde a suspensão da feira em Fundão.
“Nós aqui na roça estamos quase sem esperança. Tem muita plantação pronta para colher e não temos como vender aos consumidores nas cidades. Todos estão perdendo, a gente na roça e o povo da cidade. Não tenho expectativa boa para o futuro não. A gente fica com medo de comprar semente, plantar e investir, e não saber se vamos conseguir vender. O que nós vamos fazer? ”, afirma Stefani.
Apelo às autoridades
Para Marcel, locais de ambientes fechados como os supermercados apresentam mais riscos à saúde dos consumidores. “Nós fazemos feira em local aberto, com ar circulando cem por cento, enquanto nos supermercados, com ar condicionado, os comerciantes podem trabalhar tranquilamente. Acho isto uma injustiça com os pequenos, que sempre saem prejudicados ”.
À frente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores (as) Familiares de Santa Maria de Jetibá, entidade que representa mais de 7.000 mil associados- em sua grande maioria agricultores familiares- Egnaldo Andreatta compartilha da mesma opinião do produtor.
“Supermercado tem maior risco que uma feira livre, claro se esta não for bem fiscalizada. Se o feirante fizer toda parte de higiene exigida e as prefeituras, a parte delas, a de fiscalizar e controlar o fluxo de atendimento, a gente consegue manter a cadeia de produção que é tão importante neste momento de crise. Manter a renda mínima aos agricultores, mas também a oferta de alimentos saudáveis e de qualidade, num preço mais acessível que o frequentador de feiras está acostumado a encontrar ”, declara Andreatta.
O presidente do Sindicato afirma que está conscientizando os agricultores por meio de grupos de troca de mensagens e das rádios locais sobre a regras para manter a renda na propriedade e o ciclo de produção.
“Chegamos a um ponto que todos nossos agricultores estão conscientes. Desde a publicação do decreto oficial do governador do Estado para fechamento do comércio, fizemos contato com a Secretaria de Estado da Agricultura, pressionando as prefeituras e culminando inclusive na elaboração da cartilhacom orientações. Prova disso é que a Prefeitura de Vitória avaliou nosso pedido e nos retornou. Sou agricultor familiar, vivo em meio a eles, por isto falo e defendo a categoria como toda liderança deve fazer ”, completa Andreatta.
Produtores de orgânicos criam alternativas para manter vendas
A maior parte dos agricultores orgânicos de Santa Maria de Jetibá criou canais alternativos para driblar a crise, a exemplo do serviço de delivery para entrega de cestas na Grande Vitória.
Segundo Egnaldo Andreatta, trata-se de um momento bem específico para esses produtores, apesar de o nicho de mercado não incluir todos os produtores e não substituir a venda direta ao consumidor “com o agricultor familiar montando sua barraca e vendendo ”.
Mais Conexão Safra
O município é pioneiro e referência estadual em agricultura orgânica, com 120 propriedades auditadas e certificadas pelo Instituto Chão Vivo, envolvendo diretamente mais de 200 famílias.
Santa Maria de Jetibá fornece também produtos orgânicos para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) em vários Estados através das cooperativas de produtores familiares Caf Serrana e Cooper Fruit.
Algumas curiosidades sobre a produção hortícola capixaba e onde a “Horta do ES” é destaque:
– O solo capixaba é o maior produtor de taioba do Brasil e o título é graças a Alfredo Chaves (primeiro lugar no ranking dos municípios) e Santa Maria de Jetibá (em quarto lugar).
– O Espírito Santo é o primeiro produtor nacional de chuchu, sendo Santa Maria de Jetibá o maior município produtor do país.
– Os capixabas estão em quarto lugar no ranking nacional na produção de Abacate. Venda Nova do Imigrante é o maior produtor do fruto.
– O repolho deu ao Estado o título de quarto maior produtor nacional, sendo Santa Maria de Jetibá o segundo maior município produtor do país.
– Somos o quinto maior produtor de coco do país e São Mateus é nosso maior município produtor.
– A baroa capixaba deu ao Estado o quinto lugar no ranking nacional, e Domingos Martins se firma como o 13º, maior produtor do país.
– Santa Maria de Jetibá é o nono município que mais produz berinjela no Brasil e dá ao Espírito Santo o quinto lugar no ranking.
– Santa Maria de Jetibá é o 12º, maior produtor de pepino do país e o Estado é o sexto maior produtor.
– O jiló capixaba está em sexto lugar no quesito produção em todo país e Santa Maria de Jetibá é nosso maior produtor.
– Santa Maria de Jetibá mostra força na agricultura: é o segundo maior produtor nacional de vagem e leva o Estado ao sexto lugar no ranking.
– O pimentão capixaba deu o título de sétimo maior produtor do Espírito Santo. Santa Maria de Jetibá é o oitavo maior produtor do Brasil.
*A maior parte das reportagens no ar neste período de quarentena é fruto de um trabalho colaborativo, em função da limitação para deslocar nossos jornalistas para campo. Os próprios agricultores estão contribuindo com fotos, áudios e vídeos para tornar o conteúdo jornalístico mais atrativo para você leitor!
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